João Pessoa, 01 de fevereiro de 2018 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Os sindicatos dos atletas profissionais dos Estados de São Paulo, Santa Catarina, Minas Gerais, Bahia e Goiás acionaram na Justiça do Trabalho 16 clubes e empresas do Grupo Globo cobrando aproximadamente R$ 400 milhões por diferenças entre valores repassados a eles referentes a direitos de arena e o determinado pela legislação.
Por lei, os sindicatos deveriam receber das emissoras 5% do valor dos contratos de direitos de transmissão firmados com os clubes. Esse montante, referente aos direitos de arenas dos atletas, é dividido pelas entidades entre os jogadores de acordo com a quantidade de partidas disputadas por cada um.
As organizações de classe desses Estados, porém, alegam haver diferença entre o valor recebido das emissoras e o montante apontado nos balanços dos clubes como receita proveniente de direitos de transmissão. Pelos cálculos dos sindicatos, eles receberam menos que os 5% estabelecidos pela legislação entre 2011 e 2015.
“Estamos pleiteando os direitos dos jogadores. A obrigação do sindicato é essa”, disse Marcelo Alexandre, presidente do Sapfesc (Sindicato dos Atletas Profissionais do Estado de Santa Catarina), que questiona na Justiça os repasses referentes aos contratos assinados por Avaí, Chapecoense, Criciúma, Figueirense e Joinville.
As ações estão nos tribunais ao menos desde março de 2016. Os valores repassados a atletas de Corinthians, Palmeiras, São Paulo, Santos, Ponte Preta, Cruzeiro, Atlético-MG, América-MG, Bahia, Vitória e Goiás também são questionados por sindicatos.
No caso do clube goiano, o único cujo processo não corre em segredo de Justiça, o Sinapego (Sindicato dos Atletas Profissionais do Estado de Goiás) cobra R$ 18 milhões.
A entidade apontou que o Goiás declarou em seus balanços R$ 200 milhões em direitos de transmissão entre 2011 e 2015, mas diz que só R$ 4,6 milhões (2,3% do total) chegaram ao sindicato, quando o correto teria sido receber R$ 10 milhões (5% do total).
À diferença de R$ 5,4 milhões foram acrescidas multas e correções, elevando o valor total da ação para aproximadamente R$ 11 milhões.
No entanto, após novos documentos serem anexados à ação, foram encontrados valores não contabilizados pelo Goiás no seu balanço. Com isso, o pedido aumentou para cerca de R$ 18 milhões.
Também foi requisitado que a TV da Globo apresentasse os contratos firmados com o clube para que a Justiça pudesse calcular o real valor dos acordos.
Segundo a Folha apurou, as ações em segredo de Justiça nos outros Estados são semelhantes à contra o Goiás. Os processos contra clubes paulistas, mineiros, baianos e catarinenses somam queixas de R$ 392 milhões, deixando o montante total na casa dos R$ 410 milhões.
BRIGA SINDICAL
O decreto n° 7.984 de 2013 alterou a Lei Pelé e determinou que os “5% devidos aos atletas profissionais [referentes aos direitos de arena] serão repassados pela emissora detentora dos direitos de transmissão diretamente às entidades sindicais de âmbito nacional da modalidade, regularmente constituídas”.
No caso do futebol, não existe um sindicato nacional, que seria uma entidade de primeiro grau, representando os interesses dos atletas, mas sim uma Federação, a Fenapaf (Federação Nacional dos Atletas Profissionais de Futebol), que recebe os valores das emissoras.
O presidente da entidade, Felipe Leite, afirmou que o dinheiro depositado pela Globo é prontamente encaminhado para os sindicatos, que fazem a distribuição para os jogadores profissionais.
“A Fenapaf recebe e imediatamente repassa todos os valores aos sindicatos estaduais”, disse Leite à Folha. A entidade, que não está entre os réus dos processos, afirma não ter participação nas ações e critica os sindicatos que foram à Justiça.
“Afastamos esses cinco sindicatos que movem as ações pois acreditamos que essa é uma forma de tumultuar o trabalho que realizamos com sucesso. É lamentável que isso esteja acontecendo, não concordamos, mas a Justiça é aberta”, diz Leite.
A Folha procurou o advogado Leonardo Laporta, que representa todas as entidades sindicais nos tribunais. Ele disse que não pode comentar as ações que estão em segredo de Justiça.
Já Marçal Filho, presidente do Sinapego, declara que entrou no Poder Judiciário para defender os direitos dos jogadores do seu Estado.
“Se não entrarmos com essa ação, os atletas cobram e entram sozinhos na Justiça”, afirma o líder sindical.
OUTRO LADO
Em sua defesa no processo que corre na Justiça de Goiás, o Grupo Globo questionou a competência da Justiça do Trabalho para julgar a ação e afirmou que os valores repassados para os sindicatos foram corretos.
“O repasse do percentual de 5% da receita proveniente do direito de arena foi regularmente realizado pelas contestantes [empresas do Grupo Globo], quando obrigadas a tanto por lei ou pelos contratos que regulavam os direitos de transmissão à época, inexistindo quaisquer diferenças de responsabilidade das contestantes”, diz a emissora em sua defesa anexada à ação.
Nos seus argumentos, a empresa ainda coloca sob suspeita a acusação do sindicato goiano, dizendo que o órgão de classe não anexou ao processo documentos que comprovariam o repasse abaixo do previsto por lei. A Globo ainda aponta que tem comprovantes de todos os repasses feitos à Fenapaf, nos valores que considera corretos.
A Folha entrou em contato com a assessoria de imprensa do Grupo Globo na última sexta-feira (26), mas, até a publicação desta edição, a empresa não respondeu aos questionamentos da reportagem.
A reportagem também procurou no decorrer dos últimos seis dias os 16 clubes brasileiros arrolados como réus nos processos.
Corinthians, Criciúma, Cruzeiro e Figueirense disseram que não poderiam comentar. O Avaí apontou que o processo está em grau de recurso e que desconhece o seu teor. O Joinville foi o único clube que falou abertamente sobre o processo.
Roberto Pugliese Junior, gerente jurídico do clube, criticou o processo.
“É uma tese absurda. Pedem direitos que nem mesmo sabem se têm”, reclama.
Os demais clubes não responderam as perguntas enviadas até o fechamento desta edição.
ESPORTE INTERATIVO NA MIRA
O Esporte Interativo ainda nem transmite o Brasileiro, mas também virou alvo de processos dos sindicatos. Já existem quatro ações contra a empresa do Grupo Turner, que totalizam R$ 6 milhões. Duas delas em São Paulo, movidas também contra Palmeiras e Santos.
O Sapesp (Sindicato de Atletas Profissionais do Estado de São Paulo) quer receber 5% do prêmio de R$ 40 milhões pago pela emissora a cada um dos clubes pela assinatura dos contratos de venda dos direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro de 2019 a 2024.
O processo contra o Palmeiras foi movido em 18 de janeiro. Já na Bahia, o sindicato local está entrando com ação semelhante, cobrando porcentagem dos R$ 40 milhões pagos ao Bahia. A entidade de Santa Catarina vai cobrar pelo contrato com o Figueirense, que recebeu R$ 10 milhões.
O Esporte Interativo disse à Folha que “entende e cumpre as leis relativas a direitos de arena”, mas lembra que o pagamento “só é devido a atletas que participam de uma competição que foi transmitida”.
“Com um ano de antecedência [à transmissão], não é possível saber quem vai jogar para se efetuar a cobrança. Mais importante: os pagamentos das luvas que já foram feitos são referentes a bônus pago no momento da assinatura. Eles não são remuneração por direitos de transmissão”, afirmou.
Folha de São Paulo
OPINIÃO - 22/11/2024