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Isso que fizeram com a Fabiana foi um absurdo”. A afirmação é do neto de Dona Ivone Lara, André Lara. Ele e a família da cantora e compositora, morta por conta de uma insuficiência respiratória no dia 16 de abril, receberam com surpresa e tristeza a notícia de que Fabiana Cozza optou abandonar o papel principal do musical “Dona Ivone Lara – Um sorriso negro – O musical!”.
A decisão veio após uma série de críticas feitas a ela nas redes sociais. Segundo comentários feitos por parte dos internautas, ela, que é filha de mãe branca e pai negro, não teria a pele negra o suficiente para interpretar a sambista.
“É uma total falta de respeito com a Fabiana. Para a gente, ela é negra. Além de ser uma artista incrível, ela e minha avó se conheciam há mais de 20 anos, eram muito amigas. A Fabiana também tem conhecimento profundo de todo o repertório da Dona Ivone e consegue interpretá-lo como ninguém. Esses dois fatores – o grande talento e a amizade com a minha avó – foram determinantes para que ela fosse escolhida. E é bom registrar: a direção do musical está em contato com a gente há muito tempo, tudo foi conversado conosco antes”, disse André.
Em seu perfil no Facebook, Fabiana publicou um desabafo, justificando a decisão:
“Renuncio porque falar de racismo no Brasil virou papo de gente ‘politicamente correta’. E eu sou o avesso. Minha humanidade dói fundo porque muitas me atravessam. Muitos são os que gravam o meu corpo. Todas são as minhas memórias. Renuncio por ter dormido negra numa terça-feira e numa quarta, após o anúncio do meu nome como protagonista do musical, acordar ‘branca’ aos olhos de tantos irmãos. Renuncio ao sentir no corpo e no coração uma dor jamais vivida antes: a de perder a cor e o meu lugar de existência. Ficar oca por dentro. E virar pensamento por horas”.
A cantora tem grande familiaridade com o repertório da homenageada. No segundo álbum de sua carreira, “Quando o céu clarear”, lançado em 2007, Fabiana gravou “Doces recordações”, composição de Dona Ivone Lara e Délcio Carvalho, e “Tendência”, escrita por Jorge Aragão com a sambista.
Fabiana também fez uma série de shows em homenagem a Dona Ivone em abril, pouco antes da morte da sambista.
“Minha avó sofreu preconceito racial durante toda a vida, mas nunca, jamais mesmo, a vi tratando outra pessoa com agressividade ou desprezo por conta da cor da pele. É triste ver que situações como essa ainda acontecem. Todo esse radicalismo, todo esse extremismo apenas nos separa mais”, lamentou André.
“Dona Ivone Lara – Um sorriso negro – O musical!” tem dramaturgia assinada por Elísio Lopes Júnior e direção musical de Rildo Hora. O espetáculo foi concebido por Jô Santana, responsável por “Cartola, o mundo é um moinho” (2016).
G1
TURISMO - 19/12/2024