João Pessoa, 14 de abril de 2020 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Em meio a tantas notícias nebulosas e trágicas que infelizmente estamos nos habituando a assistir nos últimos dias, eis que chega uma inesperada: a do pombo correio que parou de voar! Ou quem sabe, alçou um voo para uma outra dimensão, de onde presenciará as homenagens que serão todas tão pequenas, diante da grandeza que Moraes Moreira representa para a música, não só brasileira e nem sempre tão popular, mas de uma riqueza e diversidade que demonstram o sincretismo sempre presente no seu estilo.
Seja nos Novos Baianos, seja em carreira solo, Moraes instituiu a lei natural dos encontros e escreveu importantes capítulos e parcerias musicais que passeiam entre a MPB, o samba, o rock, a bossa nova e o frevo.
Marcou-me profundamente a diversidade musical presente na obra de Moraes Moreira. Lembro-me do impacto ao ouvir Meninas do Brasil! Passava horas me encantando com sua melodia e sutileza poética que deslizava nos acordes dando vida e formosura às Graças do Brasil. Seguramente umas das mais belas canções que já ouvi. Mas impossível não lembrar dos carnavais e dos frevos históricos do compositor, que deixarão sua marca em muito mais de oitenta carnavais, eternizando a folia e a tradição.
Moraes era símbolo de resistência. Ele que deu voz ao trio elétrico, viu o carnaval de Salvador se industrializar e virar um produto cobiçado, mas nem sempre de valor cultural enaltecedor, ainda assim resistia, com seu trio elétrico cruzando o corredor da folia, levando a sua insistência cultural e varrendo as ruas da Bahia. Em entrevista ao jornalista Ricardo Anísio, ao comentar o lançamento de um novo trabalho em 2003, afirmou: “quis cantar aquilo que sempre achei bonito e importante, sem pensar em vender”.
Em tempos de pandemia e quarentena, Moraes Moreira deixou suas últimas composições, quase que em forma de manifesto. Em Quarentena, cordel publicado nas suas redes sociais a menos de um mês, ele falou do medo da pandemia, mas também se refere à violência urbana, às milícias, ao machismo e ao preconceito:
“Eu tenho medo do excesso
Que seja em qualquer sentido
Mas também do retrocesso
Que por aí escondido,
Às vezes é o que notamos
Passar o que já passamos
Jamais será esquecido”
É Moraes… A luta aqui para que o Brasil não continue ladeira abaixo não será fácil. E já que não tivemos chance de despedidas, é importante que saibas que a marcha em sua homenagem poderia ser lenta, mas jamais seria fúnebre, já que morarás agora ao lado de Dodô, Osmar, João Gilberto e tantos outros. Só nos resta agora olhar para Alceu Valença e confundi-lo com Moraes Moreira.
Bira Pereira – [email protected]
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TURISMO - 19/12/2024