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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

Um monólito indecifrável

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publicado em 03/10/2020 ás 08h22
atualizado em 03/10/2020 ás 19h52

Outro dia estava a ouvir num filme, o barulho da máquina de escrever. Comigo, a minha Olivetti, costurava palavras, depois corrigidas com lápis tinta, os mínimos pedaços de palavras, que eu sempre gostei de escrever. Eu fui, eu sou, eu vou. Bem mais. Minha máquina de escrever resumiu parte da minha vida.

Agora eu estou diante de um computador romântico, bem bonitinho. Me lembro da cena, o barulho das letras formatando o texto por meio das tintas preta e vermelha (da fita) ou quando ouvia o barulho da máquina de costura da Lília, que fazia minhas calças bocas de sino e eu adorava dançar.

Na vida, a gente junta pedaços de tecidos de cores, não exatamente retalhos, mas de todas as cores, para que neles possam caber músculos e ossos. As roupas não conseguem esconder nossa nudez.

Não sou deus, mas não sou qualquer um. Minhas linhas tortas sem certezas, não me denunciam,  talvez, me desnudam. Mostram minha ideologia, quem sou, meu refúgio, meu travesseiro de areia, meu delírio. Olhe bem um papel em branco, até a tela em que digitamos no computador: o que você vê?

Quando eu tinha 20 e poucos anos, e os retratos eram revelados em papel, eu achava incrível ver as imagens transportadas para uma coisa eternamente descartável. A vida da gente já foi um laboratório de fotografias, um museu pequeno e pleno de árvores genealógicas. Eu sonhava em ser professor, mas permaneço aluno até hoje.

A fotografia na parede mostra o revelado, muitas vezes mudando o foco – do mundo pequeno, cruel e amarelado, para os detalhes minúsculos interiores, o cotidiano e povoados. A moça da janela e a banda passando. Aliás, a banda não passa mais. A guerra está nas fotografias, mas a guerra não acabou.

Aquilo da imagem de nós mesmos, é uma sensação boa e ruim. O espelho. A vontade é de perdurar na fotografia. Ficar jovem com o vigor de Dorian Gray (foto), cria de Oscar Wilde. Tudo para mim parece um monólito indecifrável. Só parece.

Nós não somos um terço do que pensamos ser, diante das sacadas, dos sobrados, do sol, da gente humilde, de gente que chora vendo filmes, da canção que faz a gente gostar muito do autor. Letra e música. Do amor que o samba acabou, mas por favor não deixem o samba morrer.

Olho para a máquina de escrever na garagem e sei que ela não é um fusca, mas se falasse… O que eu não gosto é ficar contemplando o rio que passou em minha vida, mas o que resta desse viver, admirar o puro, o entendimento, o conhecimento, porque nada do que foi seria de novo. Já foi.

O tempo da delicadeza aos olhos e provocando vontades nos viés da vida toda; salas, cristaleiras, cadeiras de balanços sobre espaços onde estão os quadros. Tudo é tão bonito, tão passageiro, tão Rimbaud, tão Guimarães Rosa, tão Caetano Veloso, tão assim. Um filete de água escorre no rosto, quando não é suor, é lágrima, é chuva, mas nem precisa se molhar, sequer alvissaras.

O silencio mora comigo, jamais a amargura.

Kapetadas

1 – Se vocês acham que comer frutas é muito frustrante, estão enganados.
2 –  Aquele que se amargura, se fosse de uma tribo indígena seria a dos borocoxos. Não soul.
3 – Som na caixa: “Quem é que tá passando dinamite na cabeça do século? Quem é, quem é, quem é? Me diga você que sabe datilografia”, Tom Zé.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB