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Antônio Colaço Martins Filho é chanceler do Centro Universitário Fametro – UNIFAMETRO (CE). Diretor Executivo de Ensino do Centro Universitário UNIESP (PB). Doutor em Ciências Jurídicas Gerais pela Universidade do Minho – UMINHO (Portugal), Mestre em Ciências Jurídico-Filosóficas pela Faculdade de Direito da Universidade do Porto (Portugal), Graduado em Direito pela Universidade Federal do Ceará. Autor das obras: “Da Comissão Nacional da Verdade: incidências epistemiológicas”; “Direitos Sociais: uma década de justiciabilidade no STF”. E-mail: [email protected]

Álibi do ódio

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publicado em 19/10/2020 ás 07h39

Na Rússia oitocentista retratada por Leo Tolstói (foto) (“Guerra e paz”), o jovem Pierre Bezukhov escandalizou os demais convidados de uma das aristocráticas soirées de Ana Pavlovna, ao afirmar que o assassinato do Duque francês d’Enghien por Napoleão Bonaparte teria sido uma necessidade política, portanto, um ato plenamente justificado.

Ainda no plano da literatura russa, Dostoiévski (“Os irmãos Karamazov”), conta-nos o caso de um médico que confessara ao religioso stáriets Zósima que, quanto mais amava a humanidade em geral, menos se afeiçoava às pessoas em particular e quanto mais repulsa tinha pelos indivíduos que vinha a conhecer, mais incendia de amor pela humanidade.

A exemplo da literatura, a vida real é pródiga em exemplos de pessoas que se apaixonam por uma ideia abstrata (humanidade, igualdade, direitos humanos, liberdade, justiça social), uma utopia, ou uma personalidade política, a ponto de aceitar que se cometam os mais vis atos atentatórios à vida e à honra de adversários, desde que favoreçam os propósitos de sua visão de mundo.

Nesse sentido, muitos artistas, jornalistas e figuras públicas que se dizem defensores dos direitos humanos e da justiça social não se contrangem em desejar e expressar satisfação pela morte ou pelo sofrimento de adversários político-ideológicos, nomeadamente, do Presidente da República. No contrapolo, bolsonaristas extremados assumem atitudes análogas em relação aos seus desafetos.

A medida extrema de impingir sofrimento ou mesmo de ceifar a vida de antagonistas políticos é vista como medida plenamente justificada pelos benefícios sociais, políticos e econômicos que traria, matizados segundo a paleta ideológica de cada um.

A nosso ver, defender direitos humanos em abstrato e não se dispor a respeitar posições divergentes de pessoas reais revela, no mínimo, falta de tolerância e de empatia, qualidades que se espera de seres humanos maduros. Em suma, escutar, ponderar, dialogar e tolerar parecem-nos atitudes mais dignas, democráticas e humanas do que carregar uma mala de dogmas abstratos de religiões políticas e utilizá-los como álibis para defender atitudes vis e atentatórias à vida de terceiros.

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