João Pessoa, 19 de outubro de 2020 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Na Rússia oitocentista retratada por Leo Tolstói (foto) (“Guerra e paz”), o jovem Pierre Bezukhov escandalizou os demais convidados de uma das aristocráticas soirées de Ana Pavlovna, ao afirmar que o assassinato do Duque francês d’Enghien por Napoleão Bonaparte teria sido uma necessidade política, portanto, um ato plenamente justificado.
Ainda no plano da literatura russa, Dostoiévski (“Os irmãos Karamazov”), conta-nos o caso de um médico que confessara ao religioso stáriets Zósima que, quanto mais amava a humanidade em geral, menos se afeiçoava às pessoas em particular e quanto mais repulsa tinha pelos indivíduos que vinha a conhecer, mais incendia de amor pela humanidade.
A exemplo da literatura, a vida real é pródiga em exemplos de pessoas que se apaixonam por uma ideia abstrata (humanidade, igualdade, direitos humanos, liberdade, justiça social), uma utopia, ou uma personalidade política, a ponto de aceitar que se cometam os mais vis atos atentatórios à vida e à honra de adversários, desde que favoreçam os propósitos de sua visão de mundo.
Nesse sentido, muitos artistas, jornalistas e figuras públicas que se dizem defensores dos direitos humanos e da justiça social não se contrangem em desejar e expressar satisfação pela morte ou pelo sofrimento de adversários político-ideológicos, nomeadamente, do Presidente da República. No contrapolo, bolsonaristas extremados assumem atitudes análogas em relação aos seus desafetos.
A medida extrema de impingir sofrimento ou mesmo de ceifar a vida de antagonistas políticos é vista como medida plenamente justificada pelos benefícios sociais, políticos e econômicos que traria, matizados segundo a paleta ideológica de cada um.
A nosso ver, defender direitos humanos em abstrato e não se dispor a respeitar posições divergentes de pessoas reais revela, no mínimo, falta de tolerância e de empatia, qualidades que se espera de seres humanos maduros. Em suma, escutar, ponderar, dialogar e tolerar parecem-nos atitudes mais dignas, democráticas e humanas do que carregar uma mala de dogmas abstratos de religiões políticas e utilizá-los como álibis para defender atitudes vis e atentatórias à vida de terceiros.
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TURISMO - 19/12/2024