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Médico. Psicoterapeuta. Doutor em Psiquiatria e Diretor do Centro de Ciências Médicas da Universidade Federal da Paraíba. Contato: [email protected]

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publicado em 10/11/2020 às 06h10

Recebo um anúncio. Desses que entram por cima de tudo, dada a urgência. É endereçado a médicos. Últimas vagas do curso. Promete que você será o especialista mais conhecido de sua região, e poderá faturar três vezes mais. Para isso, é preciso que você queira se tornar um “médico celebridade”. Pior: diz-se que não é preciso tanta formação.

Essa estória de celebridade me dá arrepios. Primeiro, porque tem um cheiro de falsidade. As ditas celebridades são efêmeras. Duram o tempo de uma chuva. Com vida longa, não vive por um inverno. Então, o que o novo marketing propõe, como solução para o exacerbado número de médicos que estão sendo formados, é virar celebridade.

A fórmula, segundo diz, já gerou 47 milhões em agendamentos. Um número impressionante, caso não se tratasse da propaganda de uma propaganda. Chama a atenção, que a faculdade de medicina esconde o segredo. Não é assim. Existem, até o presente, normas do conselho federal da profissão, que se acosta em um princípio. Existe a publicidade médica. Esta é regulamentada. Lá, diz tudo que o sujeito pode ou não pode fazer, quando se propõe a divulgar seu trabalho. Para isso, jamais poderá exibir pacientes (imagens), mostrar-se melhor que seus pares, ou usar de artimanhas que possam parecer enganoso.

Fora desse padrão, não é publicidade, e sim autopromoção. A autopromoção é proibida como ferramenta de auto divulgação do médico. Um exemplo? Mostrar o antes e depois de um procedimento. Sabe por quê? Porque seu nariz nunca vai ser igual ao da Gisele Bündchen (foto), caso seu Dr. a tenha cirurgiado. Assim, ele estaria insinuando fazer uma coisa que não iria te entregar. Os cirurgiões plásticos já estão acostumados a lidar com as expectativas de clientes e os resultados reais daquilo que pôde ser feito.

Novas regras deverão ser definidas para orientar médicos em redes sociais. De um modo que eles possam, de forma ética e comprometida, fazer a divulgação do seu trabalho, sem cair no vulgar, no vale da trapaçaria, na venda fácil de seus serviços. Tenho visto alguns colegas falando do seu trabalho, de forma tranquila e sem prometer ilusões. É possível.

Qual o maior medo do descontrole? Que uma celebridade dessas passe dois, três anos atuando, e quando descoberta, se conte os mortos e/ou sequelados do seu trabalho lixo. O “Dr, Bumbum” era uma celebridade. Quantas sofreram buscando melhorar seu corpo e sua autoestima?

Se eu quisesse ser celebridade teria escolhido ser artista. Com consciência, escolhi ser médico. Escrevo como alerta a todos nós pacientes, porque podemos estar voltando aos tempos de Jesus. Teremos que aprender a escolher bons profissionais, a separar o joio, erva daninha que cresce muito, mas que, pequena, é muito semelhante ao trigo, a ele se mistura, e o mata se não for retirado. Qual profissão não tem seus joios tentando sabotá-la? Com a ajuda da internet, pode ser demasiado perigoso para a população, considerando uma medicina em crise progressiva de espaços profissionais. Deletei o anúncio.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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