João Pessoa, 16 de novembro de 2020 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Robert Reich, (foto) ex-secretário do Trabalho do presidente Bill Clinton e comentarista político democrata, propôs a criação de uma comissão da verdade para “apagar as mentiras de Trump, consolar aqueles que foram prejudicados pelo seu ódio, e listar cada oficial, político, executivo e magnata da mídia cuja ganância e covardia permitiram essa catástrofe”.
Como instrumento da justiça de transição, as comissões da verdade surgiram em meados da década de 1970. Até hoje, mais de quarenta comissões da verdade foram criadas em vários continentes. Com o tempo, a doutrina delineou as suas principais finalidades: esclarecer graves violações a direitos humanos; promover reconciliação; contribuir para a responsabilização de violadores de direitos humanos; reduzir conflitos acerca do passado.
É fácil perceber que existem várias discrepâncias entre as finalidades preconizadas pelo comentarista político democrata e aquelas que os experts deduziram e sistematizaram, a partir das experiências históricas. Contudo, a manifestação de Robert Reich revela os motivos reais subjacentes à criação de muitas comissões da verdade: vingança política, mediante perseguição de oponentes e, por conseguinte, aumento do poder político.
Para além do cabimento de uma comissão da verdade pós-Trump, é preciso questionar a necessidade e a conveniência das próprias comissões da verdade, ou seja, de criar um órgão estatal, cujos membros são nomeados pelo(a) Presidente, para reescrever a história, nomeando vítimas e responsáveis pela violação de direitos humanos.
Aos que defendem uma visão histórica menos simpática aos grupos armados de esquerda, basta relembrar o que se deu com a Comissão Nacional da Verdade, criada por lei no governo petista e que passou ao largo da sanguinária Ditadura Varguista e se recusou a investigar crimes cometidos por grupos de oposição ao regime militar. Para os progressistas, proponho que imaginem uma comissão patriota da verdade, criada por um governo liberal-conservador e constituída por intelectuais e figuras do espectro jurídico-politico da direita conservadora. Em suma, não nos parece razoável forjar versões históricas oficiais provavelmente contraditórias a cada mudança de mandato. Embora seja natural e esperado que as agremiações políticas defendam as narrativas históricas mais favoráveis aos seus interesses, questão inteiramente diversa é criar uma história oficial que instrumentalize seus propósitos.
Em jeito de conclusão, o comentário do articulista democrata joga luz sobre o real propósito subjacente à defesa que muitos políticos fazem quanto à instauração de comissões da verdade. Entendemos que os governantes não devem protagonizar iniciativas de levantamento historiográfico ou de revisão histórica, sob pena de sacramentarmos versões históricas estatais que pendulam da direita para a esquerda a cada quadriênio, ao sabor das aspirações político-partidárias.
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