João Pessoa, 21 de dezembro de 2020 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Consta que a rígida princesa Maria Nikolaevna Bolkonskaya (“Guerra e Paz”, Leo Toslstói) jamais contemplara a extraordinária beleza do próprio olhar. O semblante da filha do metódico príncipe Nikolai Bolkónski assumia um aspecto artificialmente calculado, ao se encontrar com a própria imagem no espelho.
A tragédia da beleza oculta da nobre russa reverbera até os nossos dias, embalada pela artificialidade, sensualidade e afetação dos tik tokers, youtubers e afins.
Quantos jovens (e adultos), permanentemente engajados na dinâmica das redes sociais, desconhecem a própria beleza e as próprias qualidades? E quantos pais tentam, em vão, mostrar aos filhos os predicados que lhes parecem autoevidentes e incontestáveis, apenas para serem repelidos sem cerimônia pelas jovens almas?
A busca pela aceitação entre os pares ganha uma dimensão sem precedentes com as redes sociais. A aprovação, a reprovação e a indiferença não se restringem ao grupo de amigos mais próximos, mas estão abertos a um círculo social mais largo e, portanto, impessoal.
Para aumentar o tempo em que as pessoas estão logadas nas suas plataformas digitais, as big techs contratam os melhores e mais bem pagos engenheiros de software do planeta. Estes constroem e aprimoram funcionalidades destinadas a acentuar o mecanismo de ação-recompensa que impulsiona as visualizações e, por conseguinte, os lucros das grandes corporações tecnológicas.
Nessa toada, enquanto, por um lado, o rosto da princesa russa, no romance de Tolstói, (foto) transfigurava-se a depender do contexto socioemotivo em que se encontrava. Por outro, os filtros e outros artifícios das redes sociais seduzem os usuários ao ponto destes abandonarem os seus atributos naturais em favor de mais likes e seguidores.
Não raro, as pessoas que cativamos percebem em nós uma beleza que nos é oculta. Por isso, parece-nos fundamental reduzir o tempo dedicado às redes sociais como forma de desenvolver uma identidade mais influenciada pelas percepções dos que nos amam do que pelo distorcido reflexo dos negros écrans dos telemóveis.
* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB
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