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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

Pra não viver

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publicado em 13/03/2021 às 07h00
atualizado em 13/03/2021 às 08h27

Eu escutava meu pai dizer: “fiquei para não viver” e vivia, se adiantava na lida. Acho que os livros o salvaram. Quantas vezes tentamos falar sobre isso? Se virarmos a esquina e tudo virasse junto, hein? É a mesma cena, diferente. E se acordarmos um dia e só porque está chovendo muito, nada mais é como antes? Bobagens.

Ainda tem muita gente por aí com “um rei na barriga”. Baudelaire, Bocage. Borges. Cortazar, Antonioni (foto) Será que eles tiveram muitas agonias?

O velho “frio na barriga” transforma o rio que passou em minha vida numa rua, uma praça, uma saudade. Num breve momento, o que pensamos ser uma coisa se torna outra e nossa percepção, por esse ângulo, dá vontade de extravasar, quando a gente tem lugar no coração de alguém. É tão bonito! Um cubículo já é um descanso.

Esse espaço que construímos um dentro do outro, é uma cena de um filme, mas é real também. Passa dessa coisa para outra diferente. Mas isso acontece diferente, né? Não tem a ver com o que construímos em nossa vida.

Ando triste, mas sei porque. Pessoas que me fizeram ser outro, avançar no jornalismo, já me aparecem só nas fotografias. Eu fico para não viver quando um amigo está doente. Nem tudo é Covid.

Tenho medo de vagarmos solitários por essas bandas sem atalhos, tentando entender o que acontece, aconteceu, acontecerá. É como caminhar sobre as águas, impossível, né? Quem viu milagres como eu…

Tudo mudou sem mudar nada. A culpa é do sol. E quem poderia prever? Nos próximos dias, será Abril e as ruas vão permanecer entupidas de gente nos atormentando sem usar máscaras.

A vida é cheia desses encontros inesperados e desesperados. Nós que chamamos às vezes pelo nome de “dias ruins”, que nos têm mantido vivos. Uma surpresa ou nada.

O anúncio da morte ficou banal.

Amizades travadas com porteiras. Mais uma vez e sempre. Nem mais sabemos das emoções e soleiras. Ousar questioná-las? Questionar não é a solução.

Quando escuto dizer que algum amigo morreu, eu fico para não viver. Vocês também?

Kapetadas
1 – Já não é cabível mais a indignação – é preciso criar uma palavra mais forte
2 – Estamos vivendo um momento histórico ou histérico?
3 – Som na caixa: “Mais, quero mais/Nem que todos os barcos/Recolham ao cais”, Chico Buarque.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB