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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

Obviedade do beijo

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publicado em 27/03/2021 ás 07h50
atualizado em 28/03/2021 ás 10h49

Entrei “No Caminho de Swann” e, na página 15, Proust olhou para mim e disse: “beija-me ainda outra vez”. Besame, besame mucho, please. Voltei a ler Marcel Proust? Nunca parei. Todo dia procuro por ele na luz do jardim, para que meu tempo não seja perdido nesta pandemia.

Voltaremos a Proust.

São tantas as tentativas de descobrir o que diferencia do ser humano dos outros animais. Vamos imaginar de que é verdade, os humanos são os únicos que pensam. Balela. Os únicos que representam. Balela. Escondem os mortos, idem.

Sugiro uma, talvez infalível assertiva, o beijo. O beijo que faz smack. o beijo na boca, de língua, o beijo que antecede o sexo. O beijo roubado, na rua, quando existia a rua.

O beijo na bochecha, imanência da fraternidade. O na testa é belo, de graça, bênção e cuidado.

No pescoço. No umbigo. No pé fazendo o caminho de Proust, na mão, no seio, no nariz, esfregadinho. Beijar é tão bom. Mas hoje beijar contamina.

Verbo? Contaminar. Nunca soube desse verbo conjugado na primeira pessoa do singular ou do plural. E tu?

Outro dia senti falta do beijo da cadela Lili, na minha canela. Só podia estar doente. Sim, levei ela no veterinário e, na travessia pensei no Médico das Flores, do poetinha Vinícius de Moraes.

Lili havia perdido o paladar. Ela não testou positivo. Lili não queria comer. Quando voltamos do médico, com poucas horas, lá vem ela e beija minha canela. É tão fora do comum eu ter uma canela, né? Eu cravo, viu?

Beijo de Judas, da moça da janela, de paz, do rapaz, da Sinhá. Eu queria beijar outra adormecida. O beijo não nos salvará, primeiro a vacina.

Ele é nossa marca do humano, quase encostando no bicho, tão perto dele que nos humaniza ainda mais e ainda distante, porque o smack e a língua prolongada sempre nos lembrarão de que viemos ao mundo para beijar.

Um intervalo. Uma ligação. Vocês estão bem? A poesia também. Eu estava conversando sobre isso sozinho. O corpo ajuda a reescrever a vida. Eu beijo Francisco que mora no Planalto, beijo minha afilhada Maria que mora no Rio, beijo meu filho que mora comigo. Mas eu não queria falar do beijo.

Ebulição. Pulsação. Onde estão meus Versos Íntimos, Augusto dos Anjos? “Toma um fósforo. Acende teu cigarro”, responde o poeta. “E agora, Drummond?

Diário do Brasil

Causa vertigem olhar para o Brasil. Contradições. Henry morreu. Mataram Henry. Henri morreu. Mataram Henry. Relatos mentirosos da mãe do menino, Monique Medeiros, e do padrasto, o vereador Doutor Jairinho, enojam. Eu fico para não viver. O espanto não tem pálpebras, estou cego de tanto ver esses crimes no Brasil.

Kapetadas
1 – Aquele sentimento gostoso de antropofagia onírica que é comer um sonho.
2 – Que onde quer que eu vá, que lá eu esteja.
3 – Som na caixa: “Aquele beijo que te dei/ Nunca, nunca mais esquecerei”, Roberto Carlos

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB