João Pessoa, 28 de maio de 2021 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Dia 25 deste mês de maio, comemorou-se o Dia Nacional de Respeito ao Contribuinte. A homenagem foi instituída em 15 de setembro de 2010, pela Lei n° 12.352, oriunda do PL 819, de 2007, de autoria do Deputado Sandro Mabel (PR-GO). O objetivo da lei, conforme proclama o seu artigo 1o, é “mobilizar a sociedade e os poderes públicos para a conscientização e a reflexão sobre a importância do respeito ao contribuinte”, sendo que, pelo art. 2o, “Os órgãos públicos responsáveis pela fiscalização e pela arrecadação de tributos e contribuições promoverão, em todas as cidades onde possuírem sede, campanhas de conscientização e esclarecimento sobre os direitos e os deveres dos contribuintes”.
Ser contribuinte no Brasil é, mal comparando, como uma mãe que padece, impositivamente, no inferno. Tirá-lo dessa fornalha que o esturrica dos dois lados deveria ser o objetivo mor de toda reforma tributária, a mais justa homenagem que poderia receber esse cidadão que abarrota a bocarra acanalhada e torta do Estado brasileiro, com muita grana, R$ 1, 479 trilhão em 2020, apesar do recuo da arrecadação de 6,91% em relação ao ano anterior, por força da queda da atividade econômica, dada a pandemia da Covid 19 (dados da Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil).
O fogo que queima a crosta do seu lombo cabisbaixo e obediente ocorre pelo lado da instituição do tributo em si, uma tributação alta, regressiva e concentradora de renda nas glotes insatisfeitas de poucos privilegiados. Por essa perspectiva, pelo menos em um dos critérios da regra de incidência, o contribuinte vai ser esfolado vivo, seja pelo viés da alíquota, da base de cálculo, ou de outro elemento qualquer da regra de tributação, quando não pela totalidade do regime jurídico da imposição.
O imposto de renda no Brasil é exemplo mais do que perfeito para exemplificar o lado injusto da tributação, mas, se quiséssemos avançar em um imposto estadual, bastaria lembrar-nos do IPVA, que incide sobre um veículo popular, mas deixa de fora do gravame as embarcações e os helicópteros, coisa batida, todo mundo sabe disso, como também se admira da não criação do imposto sobre grandes fortunas, o que precisa de lei complementar (art. 153, VII da Constituição), bem diferente do que ocorre com os impostos a serem pagos pela patuleia, que, para a sua instituição ou majoração, só precisa de simples lei ordinária, que requer, para aprovação, maioria simples (metade mais um dos presentes). Imposto de gente rica é outro nível, precisa de autorização de maioria absoluta, metade mais um de todos os membros das casas legislativas.
E tem mais, muito mais. Nessa toada de injustiça fiscal, é assunto para mais de século para a nossa coluna da sexta-feira, mas nos lembremos ainda do bornal de obrigações acessórias tão grande, tão cheio de deveres formais, um labirinto, encruzilhadas, becos sem saídas, enigmas paradoxais, multas, muitas multas, tudo tão surreal, que nem a genialidade de Jorge Luiz Borges conseguiria imaginar.
A assadura do lombo do contribuinte pelo viés da carga tributária, que nem é tão alta, se considerarmos os países da OCDE (o Brasil ocupou, em 2017, a 13ª posição em relação aos 36 países da organização), não parece suficiente. As labaredas incandescentes que põem a fuligem pelo outro lado, derretendo qualquer vestígio de gordura que pudesse ainda haver em sua barriga magra e tísica, ocorre pelo emprego dos recursos arrecadados, o qual é injusto, mal distribuído, ineficiente.
A mais gorda parte dos tributos arrecadados vai para pagamento dos juros da dívida. Dia a dia, o contribuinte brasileiro trabalha, para encher a boca de financistas famintos do suor e do trabalho das pessoas; para a sustentação de campanhas políticas, mesmo fora de hora; para os ralos da corrupção, da ineficiência, das propagandas disfarçadas, do luxo suntuoso de tribunais, dos cartões corporativos, das férias milionárias de agentes políticos, enfim.
E o pior, quando as condições favorecem o combate a essas mazelas, o sistema opera em sentido contrário, basta ver a última tentativa de combate à corrupção: um juiz justamente declarado suspeito pelo Supremo Tribunal Federal, uma operação megalomaníaca, parcela considerável da população esbaforindo seus preconceitos de classe, os demais Poderes da República seduzidos por uma mídia irresponsável e acrítica, enfim, tudo para o golpe final: destruição das nossas empresas, do emprego, da renda e comprometimento do Estado Democrático de Direito.
Enfim, o contribuinte não tem nada a comemorar. Essas campanhas anuais levadas a efeito pelas administrações tributárias, o compromisso de melhorar a prestação dos serviços na apuração dos tributos e sistemas de recolhimentos, de atendimento ou semelhantes são importantes, mas, diante da cruzada por justiça fiscal, que se impõe mais e mais, revela-se muito pífio, de modo que, por quaisquer que sejam os lados dessa mãe gentil — e que está assando como galeto espetado naqueles espetos giratórios —, deparamo-nos com essas situações estrambóticas e muito mal explicadas. Para acabar de completar, o foco é diminuir os tributos sobre armas e munições. Cruz credo! Que urucubaca!
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TURISMO - 19/12/2024