João Pessoa, 04 de junho de 2021 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Será que o certo é o certo, e o errado é o errado? Não! O certo tem múltiplas facetas, varia no tempo e no espaço, é um camaleão que se mimetiza e se esconde nos escaninhos das necessidades lógicas, teleológicas, das conveniências triviais, interpretações, visões de mundo, vontades que se adaptam ao frescor ou torpor da vida ou da morte. A ontologia morreu?
Será que o errado é o errado, e o certo é o certo? Não! O errado, muitas vezes, é ilusão de ótica. De repente, pelo querer das contingências, o erro é apenas uma brecha para um labirinto de verdades — ou de outras mentiras elaboradas —, fractal de possibilidades, oceano de marés que vão e vêm ao labor da lua que se parece com São Jorge subjugando um dragão, mas pode ser uma rocha maciça, nuvens no céu vadiando pelo espaço sideral, carneirinhos, monstros ou capuchinhos de algodão. A ontologia morreu!
Triste sina essa do ser humano em cata do Absoluto que não lhe reconhece presença nem importância. Sustentar sua cabecinha sobre base sólida é o que deseja, mas tudo tem milhares de significações, vaguidades, particularidades que se ajustam às forças das circunstâncias, espelho refratário à verdade ou à mentira que, como já se disse, varia sob a intensidade da luz ou à falta dela; ou ao interesse pessoal, curto ou longo, como se algo pudesse sair antes mesmo de ter entrado, o princípio da incerteza como a verdade absoluta da vida. Paradoxal.
Possibilidades! Quando as placas tectônicas das forças do universo se chocam entre si, tudo pode acontecer, e todo acontecimento, pelo olhar de algum observador, pode ganhar sentido. Sentido! Essa é a palavra-chave. O sentido das coisas pode ser uma bolha de sabão, mas, ali, dentro daquela cápsula de mistérios, alguém feito de carne e osso pode enxergar amor… ou ódio, fake news, narrativas mirabolantes, tudo vai depender de uma dança que se desenvolve sob o fio de uma navalha que corta o espelho das verdades em duas bandas de mentiras.
Cada consciência cria realidades, aqueles invólucros de sentidos, bolhas multicoloridas que mudam, se o observador for daltônico, ou se alterar a posição ou perspectiva de olhado, como se o bater das asas de uma borboleta lá na Indonésia abduzisse da verdade os mentirosos contumazes. Bola de sabão inexistente, movimento que se desfaz em uma potência fracassada, tudo transformado em outra realidade que se ostenta em nossa mente como se fosse a verdade mais do que perfeita do universo. Mentira?
Tudo que existe ou inexiste não tem essência per si. Não é. Estar, por assim dizer, em fluidez constante, voando como uma arribaçã (foto) teimosa, por aí, perdida, talvez achada, filha de Caetano Veloso ou não; vento Aracati do sertão, soprando para onde sua loucura der, se é que dá, e, se não der, que tudo esteja onde couber.
Há culpados. A tela do notebook em branco à espera de um sentido, ou o meu semelhante que não me ouve, ou me vê como eu não queria ser visto, ou como eu disse ou desdisse; como eu pensei, ou me iludi; como eu amei, ou emulei, como eu ousei ou preteri, esse rio carregado de lágrimas e risos feito de carne e osso, que tem corpo de gente, alma de gente, jeito de gente que fita os meus olhos, mas não me veem, nem eu a eles. O outro: as contingências dele; as contingências minhas e, entre elas, um rebuliço de versões chamado incompreensão.
Então, o pobre humano e sua necessidade de absoluto destampam as dores do mundo, e, como o que habita ali dentro é uma sopa de ilusões, ele acredita na palavra revelada. Na palavra que se fez luz, ao amanhecer; na palavra que burla a luz em escuridão, afinal, no início, era o verbo. E, no final, também, mas, como ele precisa de lugar seguro, para livrar-se do abismo puxando os seus próprios cabelos, ele cala, mas, em silêncio, o verbo não se faz luz, mas a palavra interpretada é um pântano subjetivo de opiniões, então ele decide morrer… ou tomar outra lapada de cachaça, afinal, não há um porre melhor do que viver nesse oceano de miragens. Paradoxal…
O que ora se diz, a impossibilidade epistemológica do conhecimento, pode ser perdoada e lamentada. A única verdade que o humano sabe é saber que nada sabe. É outra conversa, mormente se a aguardente de cana acabou, e a sede ainda pulsa dentro dos paradoxos do pensamento humano.
Daí que isso não é desculpa, para se mentir por catorze vezes na mesma CPI, com a cara mais deslavada, como se tudo fosse relativo, mesmo que as medalhas expostas ao peito do general exigissem a verdade nua e crua.
É uma questão de pragmatismo, um fechar momentâneo de olho para as grandes questões do universo, se quiser viver em sociedade. É que aqui na Terra, onde moramos, assim, tão miudinhos, precisamos da verdade compartilhada. A lição é essa: ainda que tudo esteja submetido ao talante da bebedeira ideológica ou dos paradoxos do conhecimento humano, a vida real das pessoas precisa de um mínimo de pé no chão, um consenso básico de percepção para podermos exercer a humanidade. É por isso que reconhecemos facilmente as mentiras mais cabeludas na CPI, mesmo as de um general especializado em logística e em outras barbeiragens.
Mas há barbeiragem maior, bem mais perigosa. Deixar de ver o que todos viram. Como assim, um general da ativa subir em um palanque político e não ser punido? Gente, isso não é discussão epistemológica. É saber a qual lado do “B” o Exército pertence. É o do Brasil?
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