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A consultoria de marketing e relações públicas Edelman conduziu um estudo de escala global em 2014. Como resultado do estudo, que envolveu quinze mil consumidores, a consultoria concluiu que a maioria dos consumidores esperam das empresas uma relação para além da meramente transacional. Conforme relata David Rogers na obra “The Digital Transformation Playbook”, os consumidores esperam que as marcas se posicionem perante questões políticas e sociais e suscitem a participação de seus clientes. As empresas que procedessem dessa forma poderiam conquistar, não apenas a fidelidade dos clientes, mas também o seu engajamento como embaixadores das marcas.
A percepção acima esboçada grassou na prática empresarial e na literatura de gestão e negócios. Como efeito dessa concepção, algumas corporações adotaram uma postura ativista sobre matérias estranhas ao seu objeto social e à sua expertise. Na prática, as companhias que aderem a esse ativismo buscam convencer os clientes de suas boas intenções. Nessa empreitada, as empresas não poupam elogios à forma como elas mesmas lidam com questões sociais e políticas muito complexas e sensíveis.
No contrapolo, Tobi Lütke (foto), CEO da plataforma de e-commerce Shopify, endereçou uma carta aos seus funcionários onde esclarece a posição da companhia canadense acerca do ativismo corporativo. Primeiramente, o CEO estabelece que a Shopify não é uma família, mas um negócio que opera em um ambiente muito competitivo. O CEO também deixa claro que o propósito da empresa é criar um produto que confere “superpoderes” aos vendedores da sua plataforma. A companhia, na visão do CEO, tem possibilidades limitadas de resolver problemas sociais e, quando atua nessa seara, fá-lo porque isso ajuda diretamente o negócio da empresa e não por um mandamento moral superior.
Uma empresa pode criar normas, políticas e projetos para promover a diversidade, mas elas só se concretizarão se houver harmonia com a cultura organizacional. Em alguns casos, as incoerências entre o que a empresa diz e faz eclodem rapidamente e ganham as mídias sociais. Isso ocorre, por exemplo, quando um grupo de ensino – supostamente sensível à situação econômica dos alunos – anuncia um desconto nas mensalidades, mas recebe, no lugar de elogios, inúmeros comentários, nas redes sociais, denunciando as cláusulas leoninas do contrato de adesão.
Questões sociais complexas e sensíveis, como racismo e desigualdade social demandam ampla discussão social. As universidades são, em sua essência, um lugar adequado para discutir essas questões, de forma ampla e plural. Creio que criar um ambiente de debate, onde os atores acadêmicos aprendam a respeitar as diferenças, exercitando a tolerância é uma atitude socialmente mais proveitosa do que capitalizar virtudes que a instituição atribui a si mesma.
Em suma, a ideia de que as empresas devem se engajar politicamente para transformar os clientes em embaixadores da marca conquistou ampla adesão entre as empresas. Antes de abraçar uma causa política, é de bom grado que a empresa analise a possível incoerência entre as virtudes autoproclamadas e a sua forma de atuação na vida real. Por fim, considero que o papel da universidade, por essência, consiste em suscitar o debate amplo e acolher a pluralidade, ao invés de buscar se beneficiar comercialmente do seu posicionamento político.
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VÍDEO - 14/11/2024