João Pessoa, 03 de agosto de 2021 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Dei de sonhar com estórias infantis. Uma regressão passageira a minha própria história. Noites a fio, procurando fadas em castelos encantados. Personagens fantásticos com proezas de personagens fascinantes. Eu tentando encontrar heróis fenomenais, salvadores de mocinhas belas. Alguma história adaptada pelos irmãos Grimm.
Esperei sonhos maus, com madrastas ruins e personagens perseguidoras, como ocorria nos meus sonhos mais repetitivos dos tempos de análise pessoal. Eu fugindo daquelas fazendas, divididas por cercas, como se fossem países. Algumas mais fáceis, outras impossíveis de ultrapassar. Cercas de pedira, de arame, de varas. Limites reais de propriedades rurais, limites imaginários de mim mesmo e dos meus desejos.
Tudo ao contrário. Esperando um mundo de príncipes e princesas ao mais requintado estilo europeu. Não é que me surge uma fadinha em forma de criança? Magrinha como nós. Aparentemente frágil. Até a tarde do dia anterior, nunca tinha ouvido falar em Rayssa Leal (foto). Como um encanto, Alice e Felipe comentavam sobre a fadinha que depois descobri. Uma menina mirrada, lá de Imperatriz, brincando sobre skate pelas ruas. Muito diferente das originárias da cultura céltico-bretã. Não que fosse menos deslumbrante. Mas, vamos combinar: como imaginar uma fada saindo daqui do nosso lado. Nós que que chegamos a ser desconsiderados até por irmãos nossos brasileiros. Termos uma fadinha, pequenininha, alimentando nossas fantasias de vencer, de ser um país grande, superar dificuldades. Uma fada de prata. Nunca imaginei!
Com igual proeza, um príncipe negro de Baia Formosa, com um único desejo, além do que alimentou: a presença da avó, ainda viva, para ver no que ele se transformara. Uma versão masculina de fada, plainando sobre uma tampa de isopor, e fazendo as primeiras manobras de surf num mar sem limites para sonhar. Dali, direto para Tsurigasaki, a 100 km de Pequim. Como se fora levado pela fada-avó.
E Rebeca Andrade, graciosa, linda, com suas duas medalhas, como se as fadas nos permitissem realizar dois sonhos. Ou quantos forem as nossas medalhas. Não por nós. Que ensinamos tão pouco aos nossos jovens como serem campeões. Muito mais, pelo que eles nos ensinam, como bons mestres que são.
É que todos sonhamos. Não falo do fenômeno dos sonhos dormindo, que a própria fisiologia cerebral nos obriga. Falo dos sonhos que preocupadamente formulamos ao longo do tempo. Poucos deles realizados. Decerto, porque erramos ao construí-los. Em geral, dependem de outras pessoas, ou sonhamos para outra pessoa realizar o nosso sonho. E o sonho dela é outro. Meu filho, pequenininho, sonhava ser motorista do carro do lixo. No Natal, ganhou um. Ele preferiu dirigir outros carros. Nunca cheguei a lhe dizer que aquele motorista era menos importante que nós. Ele escolheu outros sonhos porque quis tê-los livremente.
Os atletas nos ensinam a sonhar, sim. Definem um sonho e saem feito malucos em busca dele. Sabem que o sonho depende de si. De pular todas as barreiras e superar incessantemente seus próprios limites. Até que ninguém, ou no máximo dois, sejam capazes de ultrapassá-lo. Se entendêssemos assim, nunca mais sofreríamos com a inveja daqueles que realizam, nem inventaríamos sonhos para a vida do outro que, pouco a pouco, vai definindo suas escolhas e onde seu próprio sonho deseja chegar. São nossos sonhos olímpicos!
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