João Pessoa, 09 de agosto de 2021 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Retorno ao assunto do voto impresso. Sem tomar partido, porque, além de ser algo de somenos importância, sempre considerei que o voto é algo nebuloso, seja ele eletrônico impresso ou não, seja ele à maneira antiga, escrito de próprio punho. Escrutínio acabam por se tornar, em algum momento, inescrutáveis.
O retorno ao assunto é por causa dos memes que se produziram, da parte dos que acham absurdo o voto eletrônico. O meme revela uma criatividade crítica e bem-humorada, acima de qualquer ideologia partidária, ainda que aproveitado ideologicamente, como não poderia deixar de ser. Mas há limites para tudo nesta vida, inclusive para os memes e para a criatividade. Criar um meme é semelhante a criar uma metáfora, um lampejo inovador sobre um fato tantas vezes visto. Repetir um meme, no entanto, é matar a metáfora, torná-la congelada e ossificada. A repetição da metáfora, torna-se um clichê, que conhecemos com o nome de catacrese. É, em suma, a morte da criatividade.
Fazer um meme pedindo a volta do cheque, coisa antediluviana, e do cheque auditável, com manifestação programada para a frente da Mesbla, é, realmente, bem-humorado e criativo, por conseguir ir ao cerne da questão. O mundo moderno requer uma otimização de recursos e de tempo, o que a opção da informática, apesar de todos os perigos, nos traz. É impossível se pensar hoje em viver com um talão de cheques no bolso ou entrar em fila de banco para descontá-lo ou depositá-lo. Tudo se resolve com simples toques na tela do caixa eletrônico, do computador ou, ainda mais cômodo, na tela do celular. O cheque, como a carta enviada pelo correio, é um dinossauro que ignora a aproximação do meteoro…
Se o meme se repete à exaustão, perde a graça, sobretudo, quando não alcança o sentido da ironia. O que me chamou a atenção para este fato foi um meme pedindo a volta de mapas impressos e auditáveis. Em primeiro lugar, que eu saiba, mapas não são suscetíveis de auditoria. Em segundo lugar, um mapa impresso vale mais do que qualquer mapa eletrônico. Digo como Millôr Fernandes disse a respeito do livro impresso: mapa não enguiça. E não precisa de internet. Afora isso, só quem nunca se debruçou sobre um mapa e percorreu seus caminhos e descaminhos; só quem desconhece o prazer da descoberta é que toma partido incondicional a favor do mapa eletrônico. Não que o mapa eletrônico não tenha o seu valor e a sua utilidade, mas jamais terá o charme do mapa impresso, do mesmo jeito que um livro eletrônico jamais substituirá o livro impresso, à disposição de quem o possui, a qualquer hora e sob qualquer circunstância.
O leitor de mapas, assim como o leitor de livros, não se satisfaz com a resposta pronta da tecnologia. Se a tecnologia nos faz ganhar tempo, ela também nos faz perder o sabor da aventura de caminhar pelas informações variadas de um mapa impresso, fazendo-nos descobrir, muitas vezes, o que não procurávamos, essência da pesquisa, tendo como efeito colateral a felicidade da epifania com as muitas associações que podemos fazer diante do inesperado. Sei que alguém pode alegar que o meme do mapa é uma ironia. Discordo, se é chocha, a ironia não tem sentido.
Memes desse tipo, envolvendo o mapa, estão mais para aquele sujeito que, querendo se enturmar numa roda de contadores de piadas, ou conta uma piada que todos conhecem ou uma sem graça, com o agravante de não saber contá-la. Isto porque não entendeu que, assim como a metáfora, o meme é a associação de coisas diferentes, mas com uma relação subjetiva que as une.
Quanto ao voto impresso, auditável ou não, continuando achando que estamos gastando vela de libra com defunto ruim, desperdiçando energia, tempo e saliva, o que é a cara do nosso tão sofrido Brasil.
É mais proveitoso ficar de olho no meteoro.
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TURISMO - 19/12/2024