João Pessoa, 20 de setembro de 2021 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Já defini, por ironia, o homem como uma cultura de fungos contida. Cultura no sentido biológico do termo. Yuval Noah Harari, (foto) em Homo Deus (tradução de Paulo Geiger, 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2016), sem qualquer ironia, mas com um pensamento futurista e tendendo para um realismo cru, ainda que de um modo algo sombrio, define o ser humano como algoritmos bioquímicos, a partir da conceituação que as Ciências Biológicas dão a todos os organismos. Por outro lado, a Ciência da Informática aprimora, a cada dia que passa, os seus sofisticados algoritmos, encurtando as distâncias que as separam dos algoritmos humanos. Um dia, estes serão absorvidos por aqueles e seremos todos dominados pela cibernética.
Enquanto isto não acontece de todo – mas já está em encaminhamento (sabia que nossas ligações aos SAC’s não vão para qualquer atendente, mas para aquele indicado pelos algoritmos, um que poderá suportar melhor as emoções do cliente?) – vemos a grande novidade que, para mim, equivale a uma atualização do sistema: as estruturas políticas humanas não passam de um grande sistema de processamento de dados.
O problema é que os dados ocorrem numa velocidade infinitamente maior do que alguém ou algumas estruturas políticas podem processá-los. O que acontecerá é que algumas coisas que parecem ser conquistas definitivas do mundo liberal (mais no sentido americano do que no do brasileiro), sobretudo, as eleições, partidos políticos e parlamentos tenderão a se tornar obsoletos. Não que o mundo do futuro – 50 anos, no máximo – vá descambar nas ditaturas já conhecidas e não aprovadas, de direita e de esquerda. Haverá um novo sistema comandado pela cibernética e será impossível de controlar, porque a velocidade de dados e de transformação é maior do que os governos ou estruturas políticas poderão suportar.
O fato é que novas ditaduras acontecerão se continuarmos a ver o mundo com os olhos do meado do século XX e não fizermos um esforço para acompanhar o que já acontece na nossa vida e à nossa revelia. Governos já apenas administram, mas não governam ou lideram. Ou seguem os algoritmos do mundo moderno ou tendem a ficar isolados e atrasados.
É a partir desse entendimento de que somos dependentes de algoritmos que Harari nos dá uma lição simples que muitos, agarrados a um passado em franco apodrecimento, não querem entender: o capitalismo ainda funciona e ainda se liga a alguma democracia, porque é distributivo nas informações que capta, que consegue processar e que libera quando é conveniente para que o sistema possa funcionar. O comunismo, como centralizador das decisões do Estado e, portanto, das informações não funciona, exatamente porque é impossível haver desenvolvimento com centralização.
Talvez se nossos gurus e os repetidores de nossos gurus lessem Homo Deus pudessem entender que o mundo em que vivemos e, principalmente, o que se desenha à nossa frente, não comporta mais centralismos e personalismos. As democracias mudaram e ainda mudarão substancialmente. Não importa qual seja a mudança por que estamos passando ou a que nos aguarda; sei que somos, como humanos, mais do que algoritmos bioquímicos e que nossa criatividade e humanidade nos salvará, mas a verdade é que o mundo atual não comporta mais os obsoletos salvadores da pátria, quer eles se chamem bolsonaros, lulas ou ciros.
Precisamos atualizar o sistema.
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