João Pessoa, 19 de novembro de 2021 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Gasolina a quase R$ 7,00. 1 euro equivale a R$ 6,23. Comer o básico parece nunca ter sido tão caro. Estes valores exorbitantes referem-se apenas a despesas “úteis”, que interferem diretamente na compra de insumos que permitem a manutenção básica da vida. Entre os itens essenciais, dificilmente se considera o valor da arte. Talvez devesse. Afinal, se moradia, alimento e transporte nos conferem sobrevivência, a arte nos confere dignidade.
Antonio Candido (foto) considera a literatura uma necessidade universal, que deve ser satisfeita para dar forma aos sentimentos e à visão do mundo, para nos organizar, libertar e humanizar. Para o crítico literário, a literatura é um direito humano como a saúde e liberdade, e adquire este status por seu caráter de desmascaramento da opressão.
Utilizando a literatura como um instrumento consciente de desmascaramento, o escritor português Afonso Cruz desenha uma sociedade em que as famílias têm artistas em vez de animais de estimação. Em Vamos Comprar um Poeta, os artistas são vistos como inutilistas, mas a protagonista encontra no poeta uma função relevante: seus poemas ajudam a ver o mar. Então, a convivência se dá em meio a porcentagens e contabilizações absurdas, mais inúteis do que a rima alheia, propondo reflexões sobre a arte e o local da sensibilidade.
No lar para onde o poeta se muda após sua compra, o mecenas se preocupa, a priori, apenas com a subversão. É uma característica temida nos artistas, como a agressividade dos cães. É na subversão que se encontra parte da riqueza lírica, bem como na emoção. Entretanto, nesta sátira, a emoção vale pouco – bem menos do que uma hipótese científica.
Curto, o livro de Afonso Cruz pode ser devorado em uma tarde. Entretanto, não se esgota na leitura. Afinal, como o próprio poeta comprado explica: “A cultura não se gasta. Quanto mais se usa, mais se tem.”
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TURISMO - 19/12/2024