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Marcos Pires é advogado, contador de causos e criador do Bloco Baratona. E-mail: [email protected]

 A viagem

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publicado em 04/12/2021 ás 07h41
atualizado em 04/12/2021 ás 07h42

O ano era 1973 e aqui em João Pessoa um comerciante soube que o jovem S.B. estava terminando suas férias e voltaria ao Rio de Janeiro, onde residia.  O comerciante propôs que ao invés de voltar de avião ele fosse dirigindo uma Kombi que se destinava ao irmão. Tratava-se de uma Kombi daquelas antigas, que apresentava folga na direção e péssimo sistema elétrico (6 amperes), tanto assim que para buzinar ou ligar os faróis era necessário cuspir no dedo e apalpar os fusíveis a cada meia hora.

O jovem S. B. gostou de economizar a grana da passagem e convidou o amigo A.G. para acompanha-lo. Convite imediatamente aceito porem com uma condição; dois irmãos, amigos de A.G., também queriam ir ao Rio, onde o irmão conduziria a irmã até um compromisso de noivado.  Formada a lotação? Qual o quê! Quando foram buscar a tal Kombi no sitio do comerciante uma surpresa os aguardava. Um pedido da mãe do comerciante para que levassem um sobrinho dela que matara um desafeto no interior da Paraíba e iria se homiziar numa favela carioca, onde parentes residiam.

Eu precisaria de umas 20 laudas para contar as peripécias da viagem, porém só disponho de duas. Portanto lá vai: o assassino entrou mudo e saiu calado da Kombi até o final dos cinco dias de duração da viagem, limitando-se a olhar feio para todos os outros passageiros. Já o irmão quase não dormiu durante todo o percurso com medo que algum dos outros passageiros “bulisse” com as virtudes da irmã, que deveria chegar zero quilometro aos braços do noivo.

Logo na primeira substituição de S. B. por A.G. ao volante a Kombi foi espremida entre um ônibus e um caminhão e quase morriam todos naquele momento. S. B. descobriu que A.G. só “funcionava” na base da maconha e teve que fazer o resto do percurso dirigindo solitariamente. Ao amigo A.G. restou a responsabilidade de, a cada meia hora, cuspir no dedo e apalpar os fusíveis da Kombi. Quando chovia também cabia a A.G. puxar dois cordões para lá e para cá movimentando os limpadores do para-brisa.

Depois de mais muitos momentos eletrizantes (que incluíram várias trocas de pneus e “xexos” em postos de gasolina) finalmente chegaram ao Rio e à casa do novo proprietário da Kombi…que havia mudado para o Mato Grosso e deixara com o vizinho o novo endereço e um recado para que eles seguissem viagem até Cuiabá. Resumo da opera; venderam a Kombi num desmanche em Nova Iguaçu, racharam a grana e foram tomar chopes à beira mar de Copacabana.

O jovem S.B. agora é um idoso ciclista. Meu amigo A.G. está com Deus. Continuo pesquisando sobre o que aconteceu com assassino e com a virgindade da noiva. Voltarei oportunamente com atualizações.

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