João Pessoa, 09 de agosto de 2012 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
O desafio era gigantesco: vencer o atual campeão mundial e número 1 da categoria meio-pesado (até 81kg), o cubano Julio La Cruz Peraza, que já o havia derrotado três vezes, inclusive na final dos Jogos Pan-Americanos de 2011. Yamaguchi Falcão não se intimidou: com uma tática perfeita, superou o adversário pelas quartas de final das Olimpíadas, garantiu mais uma medalha olímpica para o boxe do Brasil – a terceira em Londres 2012 – e se tornou forte candidato ao ouro, numa divisão que não é a sua – o capixaba lutava anteriormente como peso-médio (até 75kg), mesma categoria em que seu irmão Esquiva conquistou outra das três medalhas do país na modalidade.
– Estou com vontade até de sentar no chão e chorar! É f…. É uma emoção nem por ter conseguido a medalha, mas por vencer o cubano, que é o melhor do mundo. É uma honra não só para mim, mas para a família Touro Moreno completa – extravasou Yamaguchi logo após a vitória, em entrevista ao SporTV.
Yamaguchi lembrou de seu pai, o ex-pugilista Adegar Falcão, que tinha o apelido de "Touro Moreno".
– Olha, paizão, eu me preparei. Você é um cara que me dá força máxima, me dá conselho, e quero agradecer a toda minha família. Minha mãe, meu pai, minha esposa… Porque a gente fez muito para estar aqui. Fiz o "L" para o Luciano, meu irmão caçula, que falou para eu dar uma "zoada" quando vencesse o cubano! Estou louco pra ver meu irmão (Esquiva), abraçá-lo e dizer: "A família Falcão é f…" – se empolgou.
Com o triunfo, os irmãos Falcão se juntaram à galeria de irmãos brasileiros medalhistas em Olimpíadas, como Murilo e Gustavo, do vôlei, Tande e Adriana Samuel, do vôlei e vôlei de praia, e Torben e Lars Grael, da vela. Na sexta-feira, os filhos de Touro Moreno estarão de volta ao ringue pelas semifinais, contra representantes de duas escolas tradicionais do boxe. Esquiva enfrenta o britânico Anthony Ogogo, e Yamaguchi encara o russo Egor Mekhontcev, que venceu o uzbeque Elshod Rasulov nas quartas. Se vencerem, disputam o ouro, em busca de outro feito raro: serem campeões olímpicos juntos. Apenas uma vez isso aconteceu no boxe, com os americanos Leon e Michael Spinks, em Montreal 1976.
A luta
De azul, Yamaguchi tomou o centro do ringue no início, mas ficava com as mãos erguidas, mais preocupado em se defender da grande envergadura do cubano. La Cruz fazia o contrário: girava pelo ringue com agilidade, de guarda baixa, e passava com cruzados perigosos. O campeão mundial mostrava boa esquiva e golpes velozes, mas o capixaba estava bem e acertou alguns bons socos. O round terminou empatado em 4 a 4.
La Cruz passou a andar mais para frente no segundo round. Yamaguchi, todavia, ganhou confiança com o bom primeiro assalto e acertou um bom direto e um gancho para fazer o cubano dar passos para trás. O brasileiro cresceu no combate, e o campeão chegou a cair – mas não por conta de um golpe. Ele se desequilibrou ao tentar se esquivar de um cruzado. Yamaguchi ainda acertou dois golpes duros no final para fazer 6 a 5 e passar à frente no placar, 10 a 9.
– Eu me preparei para não correr atrás dele, para esperar ele vir. Joguei a isca e ele foi fisgado – riu o pugilista brasileiro.
O cubano veio para cima no último round para virar o placar, mas Yamaguchi não mudou a tática: seguiu com a guarda fechada, atacando somente no contragolpe. O brasileiro teve boas sequências nos primeiros minutos e ainda acertou dois ganchos na lateral da cabeça. La Cruz continuou andando para frente, e Yamaguchi passou a se segurar no clinche. O lutador de azul levou alguns avisos por tentar clinches demais e fez o máximo que pôde para fugir do adversário. Um direto do cubano entrou, e Yamaguchi sentiu, mas se defendeu e ainda terminou golpeando.
Ao final, tanto o treinador do boxe masculino do Brasil, João Carlos Barros, como o do time feminino, Cláudio Aires, comemoraram, antes mesmo do anúncio oficial. Quando o juiz ergueu o braço de Yamaguchi, a revanche estava completa: 8 a 6 no último round e 18 a 15 para o capixaba, que soltou um berro.
– Tirei um peso muito grande das minhas costas, o peso que estava desde o Pan de Guadalajara. Eu merecia muito essa vitória. Hoje, falei para minha esposa: "Não vou lutar pela medalha, mas para tirar aquela derrota do Pan." Estou com uma vontade de dar um grito bem alto de emoção para tirar isso que estava engasgado – desabafou Yamaguchi.
Quem vai ficar engasgado por quatro anos é La Cruz e todo o povo de Cuba, que, apesar da ampla tradição no boxe, jamais conseguiu um ouro na categoria meio-pesado. Para Yamaguchi? Restou apenas um corte abaixo do olho esquerdo de lembrança.
– Para a alegria que estou, este olho aqui amanhã já está ótimo – concluiu.
G1
OPINIÃO - 26/11/2024