João Pessoa, 17 de dezembro de 2021 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Deveria haver uma lei, maior do que a Constituição e de eficácia incontestável, que garantisse aos membros da comunidade dela não se afastarem por razões de necessidade da sobrevivência. Todo êxodo é pedaço de vida que se estende para o futuro com muita saudade da que ficou.
Duvido que esses desventurados – ao menos os que nasceram na zona rural – se reencontrem ou reencontrem o cheiro da chuva se derramando pelas biqueiras choronas das casas, a catinga da merda do gado esparramada nos terreiros da casa, os banhos nos açudes, as festas de casamento, o cheiro de arroz doce, o encantamento simples da flor de jitirana.
Eu tinha um sonho e hoje, com a algibeira sentada na porta do tempo maduro, ainda se voltasse ao Sítio Saco Senhorinha, não encontraria mais o cheiro das tabocas dos fogos nas noites de novenas no mês de maio, o banho frio dentro dos riachos, a festança cheia de bolos no dia de reis magos, as quermesses e os sambas na época do São João.
Isso passou. O tempo é um bicho esquisito que não tem piedade de ninguém nem dele mesmo. Se tivesse juízo, deixaria todos os que um dia se retiraram do seu torrão voltarem satisfeitos com ele parado lá de onde o deixaram.
Além de besta, o tempo é escorregadio. Diz na maior cara de pau que só a morte permite o eterno retorno, não ele. Ele se diz outra coisa, mas sabe que é uma linha feita de sem sentidos; não é como a morte, o recomeço de tudo.
O tempo é assim. Dentro dele cabe tudo ao mesmo tempo, mas uma verdade está contida em todas as suas dobras: todo reencontro deixa pontas soltas, aquelas que foram engolidas no passado por forças das necessidades mequetrefes.
O tempo não para. É uma roda que gira com tanta velocidade que a gente nem percebe ele rodar. Melhor assim. No dia que a gente percebe o seu absoluto ele dá uma cambalhota relativa e vai embora.
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