João Pessoa, 16 de fevereiro de 2022 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
É claro que vivo lendo poemas. Poemas antigos, poemas modernos, poemas de todas as épocas e de poetas os mais distintos.
Não me lembro de um dia ou de uma noite que não tenha lido alguns versos e saboreado a calidez melódica de uma imagem, o impacto desconcertante de uma metáfora surpreendente ou a verdade indefinível de um pensamento mágico.
Leio poemas como respira, e as oblíquas insinuações da poesia me nutrem a percepção das coisas no automatismo do dia a dia.
Leio poemas, mas não me considero um bom leitor de poemas. O que seria um bom leitor de poemas? Não sei.
A propósito, em torno do poema e da poesia, quase sempre me vejo sem os instrumentos necessários para aquilatar a incontornável geografia que lhes toca os relevos e os espaços. Os mapas de que disponho me parecem precários e insuficientes para alcançar as latitudes de suas insólitas topografias.
Poema e poesia, reino do mistério! Território do indizível! Comarca de sonhos e de fantasias!
É verdade: não sou um bom leitor de poemas.
Talvez por me dar o direito de cometê-los, não consiga lê-los como deveria. Como deveria, de fato, ler um poema? Não sei. Já disse que neste setor me deixo sucumbir pelo enigma dos vocábulos, e a lógica racional vai pelos ares, toda desfeita em pedaços.
Não raro, sou tomado pela beleza incontida de um verso, vitimado pelo doce golpe de um inesperado enjambement ou completamente abatido pelo poder supremo de uma que outra palavra que se faz espinha dorsal no corpo do poema.
E ela e ele me atiçam a sensibilidade, escavam-me a memória e me estimulam a imaginação. Fico como que paralisado. Sinto um estranho medo de ir em frente. Não posso concluir a leitura do poema. Devo, sim, fazer o meu poema.
Eis por que não me considero um bom leitor de poemas. Quando leio poemas, quero logo escrever poemas, e a leitura fica em suspenso, amputada, vazia, à espera de outro momento e de outra circunstância que, grosso modo, tendem a se repetir sob a mesma modulação.
Gosto mesmo é de ler contos e romances. Daqueles que têm começo, meio e fim e que nos presenteiam com situações e personagens que nos envolvem para sempre numa redoma de cumplicidade que somente aqueles que as experimentam sabem exatamente do que estou falando.
Leio contos e romances e só quero lê-los, nada mais. Lê-los e relê-los, usufruindo dos bens intangíveis da aventura infinita da leitura. Os contos e romances, quando me movem o gosto, levam-me para dentro de suas fabulações.
Com os poemas, não: fico do lado de fora e saio à caça de meus próprios poemas. Em mim, contos e romances me acolhem; poemas me jogam no mundo, neste mundo, vasto mundo; poemas me provocam poemas.
Talvez por isto, eu não seja mesmo um bom leitor de poemas.
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TURISMO - 19/12/2024