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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

1º de março

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publicado em 01/03/2022 às 09h28
atualizado em 01/03/2022 às 07h04

Março!  O importante não é mais ser fevereiro, embora hoje seja a terça-feira gorda do carnaval.

De supetão, uma tristeza: no último dia de fevereiro, a morte de Maria Carmen, a mãe da bailarina Thatiana Rangel, (foto) que faria 70 anos hoje, 1º de março. As águas chegaram antes no rosto da família.

Imagina você preparar a festa, para comemorar o aniversário da mãe e ela não espera, adormeceu um dia antes de seu nascimento e não acordou. As pessoas dizem – a melhor morte. A morte só quer uma desculpa.

19h. A Avenida Epitácio Pessoa estava deserta, aqui, ali, um ônibus quase vazio, com vidas desconhecidas. É triste perder pai e mãe, filhos, irmãos e amigos. Como diz um amigo do Bairro dos Estados –  amanhã seremos nós.

Ninguém furou o sinal, apenas três carros circulavam na avenida. Fui abraçar a bailarina e os dois filhos, fui levar minha voz, mesmo sabendo que encontraria ali uma família em prantos.

Sai de lá com a alegria de outras águas, as que limpam os olhos da gente da minha terra, o sertão, onde “chove” de imagens da transposição e as pessoas choram de alegria.

Às vezes de tanto chorar, sorrimos no mesmo instante, mas o próximo instante é desconhecido.

Acho que não voltarei mais ao sertão, a cidade de Jatobá, que está vendo o sertão virar mar, um mar de água doce, sem ondas, para enxugar lágrimas “secas” centenárias, as águas do São Francisco.

 Outro dia na beira mar vi uma cadela caramelo a cara de Baleia, de Graciliano Ramos, bebendo água de chuva. Perguntei o nome dela, e a dona disse:” Frida”. Apressei o passo e esqueci a cena, afinal, a Baleia de “Vidas Secas”, nunca poderia se chamar Frida.

As adaptações e o modo com que o mundo segue a resposta das águas que destroem cidades brasileiras, que tirou o foco diante da crueldade da guerra da Rússia contra a Ucrânia, tem nos tornando espectadores impotentes, até diante da solidariedade. Afinal, ninguém vive só solidariedade, igual dinheiro, que é um pedaço de papel.

Somos ínfimos no suportar das perdas, cuja dor se rasga a boca, um grito calado, e tudo vai ficando oco e as pedras não se encontram mais.

Perder pai e mãe não é fácil. Eu sei.

Tente nos surpreender, Thatiana. A dança é a sua vida.  E quando chover novamente, vamos dançar na chuva, que ajuda a gente se vê.

Kapetadas

1 – Ocupo-me dos sentimentos, do amor.

2 –  As velas choram.  As velas não existem mais.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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