João Pessoa, 04 de março de 2022 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Poucas leituras podem ser mais dolorosas do que a de Arrastados, investigação jornalística sobre o rompimento da barragem de Brumadinho, publicada pela editora Intrínseca. O livro provoca dor pelas vidas perdidas, indignação pela irresponsabilidade em relação à segurança do trabalho e esgotamento pelo trauma dos sobreviventes.
É, mais uma vez, um trabalho primoroso da jornalista Daniela Arbex (foto) Não sei como ela consegue dormir em paz após imergir em tragédias tão duras. Arbex já se debruçou sobre o incêndio da boate Kiss e sobre os horrores do hospital psiquiátrico de Barbacena, onde maus-tratos eram frequentes. Após ler seus livros, eu não durmo. Quando voltava para encontrar familiares das vítimas da boate Kiss, Arbex recebeu fotos de uma moça que estava desaparecida por causa do rompimento da barragem. Tocada pela imagem da moça, Daniela Arbex foi a Brumadinho, em Minas Gerais, para apurar detalhes técnicos e conhecer melhor os envolvidos com a barragem explorada pela Vale.
Essencialmente, a jornalista honra a vida de quem não pôde continuar. Mais do que comprometida em realizar investigações éticas, Arbex preza pela sensibilidade ao olhar para o outro. Assim, apresenta a história de uma mulher que almoçava, em casa, com o esposo, o filho e a irmã. Perante a avalanche de lama, acordou sozinha. Todos os outros estavam mortos. Conhecemos trabalhadores que lutaram pela vida, correndo em uma caminhonete, tentando ser mais velozes do que a lama. Ouvimos sobre uma mãe que chegou em casa e descobriu, pela TV, que houve um desastre no local de trabalho da filha, dando início a um calvário em busca por notícias. Aliás, algumas famílias sofrem com a ausência de notícias até hoje, já que quatro corpos ainda não foram encontrados.
Houve funcionário que acordou soterrado, com lama nos olhos, na boca e no nariz. A leitura de um livro tão duro e triste, mas necessário, nos faz acordar com esse mar de lama no pensamento.
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OPINIÃO - 22/11/2024