João Pessoa, 23 de março de 2022 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
As opiniões fazem parte historicamente da sociedade e do todo processo evolutivo do convívio entre pessoas. Fomos criados com o faça isso, não faça aquilo, está certo, está errado, mas nem sempre as opiniões fazem parte de uma intenção construtiva, mas sim da imposição do exercício de pessoas opinando umas nas vidas das outras.
A prática do opinar se fortalece com o fato de que o desejo de agradar é um dos grandes termômetros de aceitação e status entre as pessoas, que muitas vezes parecem fantoches sem voz, respondendo e se comportando seguindo scripts que não são seus. Nesse sentido, vemos muitos adolescentes que já vem munidos da tal crise de identidade, sem completar esse ciclo de autoconstrução, fundamental nessa fase. E devido a tantos caminhos e direcionamentos alheios, o jovem simplesmente vai, e assim, não sabendo aonde chegar, obviamente se perde, pois o medo da rejeição o faz olhar muito mais para a janela (outros) do que para o próprio umbigo (si mesmo).
Na seara da filosofia, Sócrates enfatizava que a “felicidade plena” passa invariavelmente pelo processo de não se importar tanto com a opinião dos outros e afirmava que era impossível agradar a todos. Epicteto, filósofo grego, trás em seus manuais que não são as coisas em si que impactam a vida das pessoas, mas as opiniões alheias sobre as coisas…
A linha é muito tênue entre o que realmente é relevante e o que não é, não sendo construtivo, nem tão pouco qualitativo, mas impactam de forma muito significativa no outro. A ultranecessidade da aceitação por pessoas alheias e o que trazem nas suas opiniões leva a um ciclo que se retroalimenta, não tem fim e tão pouco, caminhos definidos.
Por outro lado, a negligência em relação aos sinais do coletivo ou a certas opiniões (quando tem contexto e validade) pode causar isolamento social e gerar muitos conflitos de relacionamento. Pode demonstrar ausência de sensibilidade e levar a ações inadequadas. Obviamente que aqui não se faz uma apologia ao “to nem ai para o que os outros pensam” ou o “ninguém paga as minhas contas”.Na realidade seria uma hipocrisia e no mínimo uma irresponsabilidade, tendo em vista que somos seres integrativos e vivemos coletivamente. O bom senso nos ensina que precisamos ter autocrítica e buscar nas opiniões, o que é relevante para o cultivo das boas relações e de um bem estar social.
O grande ponto dessa dualidade, como várias coisas no nosso cotidiano, é o ponto de convergência e de equilíbrio. Um exemplo marcado em nosso dia a dia e bem perigoso nessa dualidade é a vida paralela e intensa das pessoas nas redes sociais. Certa vez li sobre o monólogo coletivo que se impera nas redes, no qual as pessoas falam o que querem, como se não houvesse ninguém do outro lado, exercitando muito mais seu “poder de falar” do que realmente de interagir e agregar.
O exercício da intolerância é massivamente presenciado nesses espaços de fala sem a presença efetiva do sujeito, pois de alguma forma vive-se em um mundo paralelo e com muita permissividade em relação a vida do outro, que por sua vez passa a se expor e ficar vulnerável. Mas será que a exposição do outro me infere um poder de intervenção na sua vida? Qual o limite?
Podemos fazer uma analogia da crítica desconstrutiva(chamaremos assim as opiniões alheias sem permissão e sem fundamento) nas redes sociais, como alguém que bate na porta da sua casa para dizer algo negativo e que não lhe agrega em nada, como recentemente li um comentário que falava sobre a feiura de uma determinada criança. É algo tão grotesco, que nos perguntamos se é realmente assim, como cantava Lulu Santos, que caminha a humanidade. Hoje as pessoas não só batem na porta da sua casa para agredir como abrem a geladeira e deitam no seu sofá, analisando as condutas nas redes sociais.
Cabe a cada um de nós, avaliarmos o que realmente nos edifica e nos interessa como construtores em nossa vida. O que ouvir, o que guardar e como aquela opinião podeinterferir em mim, positiva ou negativamente. Ter esse discernimento a cada dia fortalece e blinda toda falta de limites transvestidos como liberdade de expressão, principalmente quando ferem o princípio básico da liberdade que é: minha liberdade termina quando começa a sua.
Cada um tem a própria régua da sua verdade, que só mede a si mesmo, com base na vivência percorrida. Na mochila da sua vida, só cabem as suas coisas, suas alegrias, tristezas, construções e desconstruções, e além de tudo, nos seus sapatos, assim como na fábula da Cinderela, só cabem seus pés, porque o caminho é seu, só seu.
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OPINIÃO - 22/11/2024