João Pessoa, 06 de abril de 2022 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
A montanha era enorme, mais de dois mil metros de altura. Feito homem aranha, porém, sem os fios mágicos com seus mágicos adesivos, eu a escalava completamente solto em meio ao ar espesso da delirante atmosfera.
Ao chegar, livre e resoluto, ao topo do extraordinário acidente geográfico, seu corpo latitudinal de imensas vértebras de gelo começa a se derreter, transformando-se, aos poucos, mas decisivamente, num vasto açude de águas negras, lodosas e lúgubres, onde naufrago qual um barco bêbado à deriva da vida e da morte.
Ao sentir nas vísceras o agônico espasmo da asfixia, num desconforto mortal de quem adentra fétidos e impensáveis mundos, penso que acordo, em gritos lancinantes, de um pesadelo que a escuridão da noite prolonga pelo tecido vertical da dolorosa vigília.
De outra feita, vejo-me dentro do meu próprio túmulo, suportando desesperadamente as picadas cortantes da claustrofobia, numa situação de absoluta ausência de ar, luz água e outros elementos essenciais à ilusão de existir.
De repente, o túmulo se abre em diversos portais dando para um deserto. Este deserto lentamente vai se configurando numa paisagem urbana em que casas são cruzes partidas e as praças são películas de neve.
Agora, não acordo; apenas mergulho numa onda de poeira de cor ensanguentada que cobre a cidade como uma avalanche infinita. A sensação que me toma, nesse estranho universo de carnadura indescritível, é de angústia e melancolia, talvez algo como os temores e horrores de um goleiro na hora do pênalti ou da vítima indefesa sob o brilho sardônico do machado que a fará em mil pedaços nervosos.
Sonhos!
Tudo é tão somente sonho, e nada tem lógica, assim como a arte e a vida. Assim como a linguagem, e tudo é linguagem. Os sonhos, a arte, a vida, as pessoas, tudo, linguagem. E se somos linguagem, vivemos então e inteiramente perdidos na floresta de signos, símbolos, índices e ícones, ora no eixo das condensações, ora no eixo dos deslocamentos.
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TURISMO - 19/12/2024