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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

Elizabeth, uma avó para nunca esquecer – por Emília Maria Santos Nóbrega

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publicado em 10/06/2022 ás 07h00
atualizado em 09/06/2022 ás 22h51

Abrimos espaço na coluna desta quinta-feira, para publicar o texto de Emília Maria Santos Nóbrega Coutinho, que recebeu a carteira da OAB/PB esta semana e escreveu esse belo texto sobre sua avó paterna, Elisabeth da Nóbrega Coutinho, sua eterna “vovó Beta”

Emília Maria Santos Nóbrega

Hoje completa uma semana de um dia muito duro, mas um dia de paz.

Falar dela, Elisabeth da Nóbrega Coutinho, minha eterna “vovó Beta”, é uma das missões mais suaves que eu já me propus viver.

Não há trabalho quando se tem tanta memória. Não há dor quando o coração tem a certeza de que ela está em paz.

Doce ilusão a minha acreditar que uma palavra conseguiria descrever minha avó.

Ela, aquela Beta que ficará eternamente em cada coração presente, possui não uma, mas um belo conjunto de palavras que a personificam. Personalidade, elegância, força, fé, zelo, carinho, dedicação, família.

E família é algo que minha boca nunca vai conseguir descrever o que meu olhar captura e o coração guarda.

E assim eu eternamente guardarei vovó.

Relatos ou vivências, suas ações sempre foram destinadas aos seus. Demonstrava a sua maneira, com sua linguagem de amor sempre gritante, que seus atos de serviço muitas vezes diziam aquilo que a boca não conseguia.

Sim, ela falava por ações. Nóbrega raiz, como brincamos.

Falo como neta que minha avó carregava todas essas características no olhar ao voltá-lo para nós, seus netos, mas o amor sempre sobrepunha qualquer deles.

Como neta também (e neste momento não falo por todos, mas por mim), tinha nela uma das maiores advogadas do país, quiçá do mundo. E digo, com um coração grato, que fiz uso, ate abusivo, dos seus serviços em minha infância.

Gratidão por tudo, minha vó.

Da infância, em quase todas as minhas melhores memórias, ela está presente. E (não teria como ser diferente) a casa 98 de Camboinha como palco de tantas delas. Ali era o meu castelo preferido, e ela a minha fada madrinha.

Foi na infância também que aprendi a admira-lá praticando, e com ela amar, a arte de cozinhar. Dentre tantas receitas, que incansavelmente fazia, levo em especial o seu arroz, macarronada, strogonoff e o famoso pavê.

Ah, vó, guardarei eternamente aquele último pedaço dividido com Nathalia, Júlio e Papai.

Aprendi desde cedo a admira-la. Admiração que carrego comigo aqui, em meu peito. Mas não há surpresa nisso. Não havia barreira alguma para tanto.

Além de tudo o que já citei, eu te agradeço por sua paciência, minha vó. Fosse nas madrugadas em que, mesmo sabendo o trabalho que eu daria, não me despachava para casa; fosse nas tardes com incansáveis perguntas sobre a vida dos Santos.

Sua fé, ah sua fé, essa é modelo para mim. Obrigada por ter me feito Católica Apostólica Romana.

Intrínseca a ela, levou cada característica citada até seu último dia.

Dos momentos da UTI eu só desejo guardar sua força, sua personalidade, mas, principalmente, o gesto mais nítido do seu amor. Mesmo com a anemia tendo roubado suas forças, ao me ver aos prantos reuniu aquilo que tinha e não tinha para me consolar. Aquele forte aperto de mão, minha avó, eu levo em meu coração até meu último dia. Foi o maior consolo que já recebi.

Conforta saber que hoje a senhora não tem mais tubo, não tem mais sonda, nenhum desconhecido está acordando a senhora para furar seus dedos, braços ou pescoço.

(Digo isso pedindo licença às autoridades religiosas presentes, mas o coração de uma neta preferiu temporariamente esquecer a escatologia e buscar o que há de mais lúdico para consolar. )

Depois de tanto sofrimento, incômodo e cansaço, agora a senhora pôde matar a saudade dos que tanto ama. Abraçar seus pais, Conceição e Rodopiano, e irmãos, Guilherme, Seráphico e Fonzinha, e pode voltar a ter os famosos segredos de túmulo com Tia Diva. Pode reencontrar e reunir suas amadas vizinhas, Nair e Glaucia. Seus avós, padrinhos, tios, primos, amigos e compadres. Quanta coisa para falar.

Saiba que o mar de Camboinha nunca mais será o mesmo. Desde o dia 30 de abril, seus olhos não pousam mais lá para apreciar, seja encostada no portão, no muro que me ensinou a pular, ou sentada naquele balanço que no fim só aguentava a senhora.

Mas se memórias de sua vida forem eternizadas conosco, e vão, a casa 98 da eterna Rodrigues de Carvalho carregará para sempre seus trejeitos. A síndica de Camboinha descansou, mas até os micos que por ela eram alimentados levarão suas ações.

Descansa em paz, vó! Contempla a face de todos aqueles que nós tanto falamos e que a senhora me ensinou a amar. Serás para sempre a “vovó Beta da minha infância”, guardada em meu coração para que não haja o perigo da memória me roubar. Amo a senhora.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB