João Pessoa, 11 de agosto de 2022 | --ºC / --ºC Dólar - Euro

ÚltimaHora
Magistrado, colaborador do Diário de Pernambuco, leitor semiótico, vivendo num mundo de discos, livros e livre pensar. E-mail: [email protected]

Como vale a pena!

Comentários: 0
publicado em 11/08/2022 ás 11h02
atualizado em 11/08/2022 ás 11h09

( Este texto, o prefácio que escreci sobre o livro  VALE A PENA! MEMÓRIAS INICIAIS DE UM PAU-RODADO,  lançado no inicio deste ano é em memória do escritor paraibano Fernando Almeida, que faleceu nontem – 10 de agosto 2022, em Cuibá, Mato Grosso)

Além de ser uma honra é muita responsabilidade aceitar o convite de Fernando de Almeida para prefaciar sua nova obra. Fomos parceiros no ano de 1977 quando lançamos, juntos, nosso primeiro livro de poesia À época eu usava o pseudônimo Juca. A partir de então, Fernando não mais parou transitando com desenvoltura por outros estilos da arte literária.

Eis agora o mais recente rebento VALE A PENA! MEMÓRIAS INICIAIS DE UM PAU-RODADO, narrativa romanceada de sua trajetória de vida, escrito numa linguagem coloquial que faz do leitor um confidente, um parceiro de mesa de bar num clima de total descontração. Fernando viveu muito, não no sentido cronológico, pois ainda a muito o que viver, mas em intensidade. Batalhador, inquieto, desbravador, ombro amigo, perspicaz, e toda essa aglutinação fez com que mantivesse, até hoje, o menino curioso e inteligente que habita o seu corpo de homem.

Memorialista antenado, nada ou pouca coisa escapa de sua narrativa. Da infância estudando para ser padre ao mocorombo inconformado em cumprir o serviço militar obrigatório; do jovem militante em lutar contra o regime ditatorial que conduzia os rumos do Brasil com coturnos e baionetas, até a leveza e agruras do filho; pai; marido; professor e outros que tais.

Comovente o momento em Fernando, ao saber da morte do pai, quilômetros de distância de onde estava, sozinho sentou à mesa de uma lanchonete e chorou. Sequer pode velar o corpo do patriarca e assistir seu sepultamento. Não menos diferente com a notícia do falecimento da mãe, embora com esta ainda teve a oportunidade de estar a seu lado um dia antes de seu desencarne. Mas também não a acompanhou até a morada final. Como toda boa história, teremos risos e lágrimas, derrotas e vitórias.

Este é um livro que vale a pena ser lido. De um fôlego só. Pois tudo é simples e ao mesmo tempo grandioso. E nisso consiste a beleza de sua história. Fernando é paraibano do brejo de Areia e trago aqui as palavras de um outro paraibano, este sertanejo, poeta, escritor e jornalista Ascendino Leite, quando disse: “A volta a tal passado não será a restauração do que foi falso, e continua falso, mas precisamente dos valores comprovados de sua força criadora que subsistiram nas possibilidades de compreensão de todo mundo” (O vigia da tarde, EdA Edit., 1982).

Fernando morou em várias cidades do Brasil até ser hoje um “pau-rodado”. Como assim? Cuiabá, a capital mato-grossense, é rica culturalmente em função da diversidade. Espalhados pela cidade se encontram, misturados aos nativos, brasileiros das mais diversas partes do país. Os que nascem e se batizam em Cuiabá são distinguidos pela expressão foneticamente pronunciada: “cuiabano de tchapa e cruz”. Já aqueles que residem na cidade e vieram de outro Estado são denominados de “pau-rodado”.

Em verdade, o autor é cidadão do mundo pois sabe cantar sua aldeia e dela fazer seu universo de beleza e grandiloquência. Ao final da leitura deste livro fica aquele gostinho de quero mais. E como o próprio título já insinua, essas são suas memórias iniciais, outras certamente estarão por vir.

Que venham logo, Fernando, pois sua história de vida em muito contribuirá para enriquecer a história de todos nós, pela sua grandeza, inteligência, simplicidade e, sobretudo, pela capacidade de transpor obstáculos e amar infinitamente a vida!

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB