João Pessoa, 31 de agosto de 2022 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Em um artigo, intitulado “O mundo do futebol”, Felipe Gesteira escala a seleção de seu xará, à época, assim convocada: Júlio César, Jefferson e Victor; Daniel Alves, Maicon, Marcelo e Maxwell; Thiago Silva, David Luís, Dante e Henrique; Luiz Gustavo, Paulinho, Ramires, Hernanes, Fernandinho, Oscar, Bernard e William; Hulk (foto), Neymar Fred e Jô.
Li em silêncio e depois repeti no compasso cadenciado da oralidade, destacando os titulares. Vi-me, então, como aquele personagem proustiano, degustando a “Madeleine” e bebericando o chá, numa viagem comovida aos sítios da infância, envolta nas neblinas finas da Serra da Borborema, no Presidente Vargas ou no Plínio Lemos, num período em que o campinense Futebol Clube, isto é, a Raposa, reinou, isolado e altaneiro, num terreiro sem o Galo e num reinado sem o Belo.
É verdade, meu caro Felipe: o futebol é muito mais que um esporte. Há, por trás de sua alquimia orgânica, algo de filosófico, um quê de religião, todo um nutriente dramático e a surpresa mirabolante da mais pura poesia. Veja bem: ao dizer, ou melhor, ao recitar, para mim mesmo, os nomes sequenciados dos craques da Canarinha, como que vivo e saboreio a alternância rítmica da musicalidade vocabular, num jogo de fonemas harmonizados que se aproxima por demais da acústica encantada de um poema. Didi, Pelé, Garrincha, Zagalo, Vavá, assim mesmo, nesta linhagem sonora, me trazem evocações de tempos idos, associados decerto à magia do rádio e à elocução emotiva de narradores invisíveis.
Félix, Carlos Alberto, Brito, Everaldo, Piazza, Clodoaldo, Gérson, Rivelino, Pelé, Tostão e Jairzinho. Como esquecer a alegria suprema do tricampeonato no Estádio Jalisco, no México?! Estes nomes são sintagmas, são emblemas, são paradigmas: quer no campo da linguagem, quer na linguagem do campo. E, pelo menos a mim, me soam com a sacralidade da palavra poética, naquilo que ela pode reter do vivido e do perdido. Futebol, como poesia, também é memória. Memória é história, e história, diz um poeta, é remorso!
Decorei muitos versos de Pessoa, muitas imagens de Augusto, muita chave de ouro de Camões. Repito-os para mim mesmo, no silêncio metálico das insônias, quando o túnel da noite se espicha na líquida nervura da solidão, e só o eco miraculoso dessa melodia lexical me acalma na espera inerte da manhã que chega, tocando-me com “os dedos róseos da aurora”. Às vezes, também me pego, murmurando para mim mesmo, numa linguagem molhada de emoção e lembrança, nomes que me habitam o imaginário e que foram a base sólida do maior time de futebol da Paraíba no primeiro lustro de 1960.
Elias, Betinho, Nelson, Preta, Massangana, Zé Preto, Augusto, Braga, Caixão, Ibiapino, Ireno, Burunga, Araponga, Humberto Mota e Zeca, eis o escrete imbatível de 1960, 61, 62, 63, 64 e 65, quando o Campinense se sagrou hexacampeão, numa campanha única e invejável. Tanto foi assim, que o professor Givaldo e o professor Edônio, alvinegros de coração e mestres dos mestres na história do esporte, não me deixam mentir.
* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB
OPINIÃO - 22/11/2024