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Nem sempre os grandes navegadores sabem para onde estão indo. Foi devido a uma falha de roteiro que as navegações portuguesas atracaram na Ilha de Vera Cruz e desencadearam uma sucessão de eventos que resultaram no Brasil. Após uma colonização, um genocídio indígena, séculos de escravidão, um Tratado de Tordesilhas e muita miscigenação, cá estamos nós, falando português.
Nesse sentido, a ramificação dos idiomas nascidos do latim nos faz economizar interrogações escritas em textos de língua portuguesa. Enquanto os países vizinhos, na América Latina, se questionam com o sinal de interrogação duplicado e até invertido, nós, brasileiros, nos restringimos a um único símbolo de pontuação. Não é sinal de sagacidade: ser portador de um RG brasileiro é uma delícia, mas traz muitas incertezas.
Na Ciência, quem tem uma pergunta tem uma pesquisa. Na Literatura, a pontuação é suficiente para preencher laudas. Machado de Assis dispensa o verbo no capítulo LV de Memórias Póstumas de Brás Cubas, intitulado O velho diálogo de Adão e Eva. (foto) Bastam-lhe os personagens e uma série de pontos – finais, exclamativos, interrogativos.
Segundo Alberto Manguel, no fascinante livro Uma história natural da curiosidade, o ponto de interrogação, a representação visual da curiosidade humana, chegou tarde . No Ocidente, o punctus interrogativus parece só ter surgido no fim do Renascimento, quando foi publicado um manual de pontuação para tipógrafos. A marca, que assinalava uma pergunta, requeria também uma resposta. Quão inflexível! Nem mesmo os grandes navegadores sempre sabem para onde estão indo. Entre o desconhecido e a descoberta, a pergunta nos move.
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OPINIÃO - 22/11/2024