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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

Procurando Vanzolini

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publicado em 06/11/2022 às 08h12

     De noite eu não rondo mais a cidade, a te procurar. A palavra exata não seria encontrar, já que eu não gosto mais de carnaval. Quem nunca rondou a cidade, quem nunca viu a madrugada, quem nunca tirou sua virgindade, não sabe que o gozo é o alimento da almas.

     Para voltar a rondar a cidade, teria que desobedecer a um registo de perder, para me encontrar ou te encontrar. Nada mais belo do que o levantar a saia e, se saia eu tivesse, de alçar a perna como fazem os cães, mas a cidade está cheia de câmaras.

     Não mande o tempo à merda, se você rondou a cidade a me procurar sem encontrar, estou dormindo e não tomo remédio, eu espero a hora chegar.

    Quem virá me socorrer (?) se algo decepar meu sonho de menino se depois do amor, depois do amor, é só chorar, só chorar.

      Com o vigor da idade sei que posso ir bem mais, porque nenhuma artilharia poderá deter a vontade, se eu ainda quiser rondar a cidade, a te procurar.

      Quando eu era jovem voltava dos bares de Tambaú a pé, porque naquele cenário, o meu automóvel era meu pé de Jacarandá. Numa madrugada, eu vi Januária na janela, mas toda gente ainda dormia e só eu a homenageava. De noite eu não rondo mais a cidade, sequer para ouvir alguém cantar o compositor Paulo Vanzolini (foto)

      O combate do amor sereno, na rua, na chuva, na moenda, talvez por isso, não há  sex appeal, o sexo é sutil, mais dentro, mais por dentro, de um homem que não ronda mais a cidade. Sem a música eu seria um homem infeliz.

     Fases do tempo, fases de conta, contas e pontas de areia, travessia e o belo Milton Nascimento com 80 anos, sentado com a sanfona, o instrumento inicial.

     Já não tenho mais saudade de mim. Conto o conto sem aumentar o ponto, da cor que azuleja o dia e quando o céu está chumbo, apesar dos pesares, inspira-me a vontade de rondar a cidade, só pra ver o meu bem passar.

     E não quero mais que isso, saber muito menos do que isto, porque quem sabe menos das coisas, sabe muito mais que o Roberto.

     Estou de volta ao teu aconchego, como na marcha dos relógios.

      Tudo, menos a tristeza, que foi embora. Tudo, menos a corda,  acorda, acorda, acorda, acorda.

      Tudo, menos o palpite, a reclamação. Tudo, menos a vontade de sair para rondar a cidade, mas eu vou.

        É tudo ou nada, Bandeira não dar bandeira, Borges é o melhor. Eu pulso, nunca a pulso, para sacudir o meu casaco de general.

         Os dias passam e a gente morre nos sinais fechados, sem prognósticos, vivendo apenas para casa & comida. Melhor esperar a madrugada, e que ela venha com o cortejo do aroma do jasmim da nossa casa, e que não seja por isso, mas por aquilo que eu insisto em de noite, rondar a cidade.

 Kapetadas

1 – Virgindade é uma coisa que dá e passa

2 – Viver no Brasil é achar natural o sobrenatural
3 – Som na caixa: “Levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima”, Paulo Vanzolini

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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