João Pessoa, 09 de novembro de 2022 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Lista de algumas coisas de que gosto
principalmente quando a tarde anoitece.
que me comovem.
nas carruagens de Bach ou de Bethoveen.
acariciando o veludo da noite.
pelo menos uma vez por semana.
O Testamento
I
Do inventário constam
os seguintes bens:
as poças de pedra do cariri,
meu curral de boi de osso,
a máquina (caduca) de puxar agave,
os grotões, as chãs, os umbuzeiros,
tantas coisas que perdi.
Soberano, que me ensinou
as letras da caatinga;
Estrela-vésper, láctea, leite,
a porteira bichada,
o moirão iluminado.
Minha biblioteca,
meu cachorro de estimação,
os dominós de minha amada,
o alho de minha solidão.
Minha fazenda de murmúrios,
as estórias de John Fante,
um pedaço de perfume, bulas,
poemas, textos,
nada mais.
II
Da partilha ficará:
Pra minha mãe,
essa légua tão tirana.
Pra Mariana, um colar de sonhos.
Pra Carolina, os sonhos da colina.
Pra vó de Wellington,
deixo o meu Tolstoi.
Pra Lúcio, o meu pedaço de sol.
A Edônio, entrego as mulheres
de cabelos curtos.
Pra Milton fica a garça, o mar,
a França.
Pra Edilson fica a rede
e a nota perdida do “Mestre Romão”.
E pra alguns amigos que fiz,
o tempo que perdi.
Pra Morais, o De profundis,
o Texas, o nunca mais.
Fica pra Magno
o silêncio e seus relevos.
Pra Cori, os evangelhos.
A Tavares devolvo o Pico do Jabre,
o Sanhauá, as franjas de Pedro Ivo.
Fica pra Vera
o sangue de meu caule,
os meus retratos, a minha estante,
o meu Jesus Cristo.
Pra meus irmãos,
um vinho qualquer.
Primos, tios, avós,
todos os dias da semana.
Pra mim,
o inevitável bolero
da morte.
(Do Livro da agonia e outros poemas, 1991)
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OPINIÃO - 22/11/2024