João Pessoa, 24 de maio de 2012 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
A decisão da Câmara de aprovar um projeto que acaba com a exigência da aprovação das contas de campanhas eleitorais e reabilita os chamados “contas-sujas” provocou reações negativas no Judiciário e nos movimentos da sociedade que lutam contra a corrupção na política. Políticos e especialistas eleitorais, no entanto, defendem a medida. Um dos que votaram no Tribunal Superior Eleitoral, em março, pela necessidade de aprovação das contas eleitorais para que o político possa se candidatar, o ministro Marco Aurélio Mello alfineta os parlamentares e diz que não foi a primeira vez que o Congresso Nacional reagiu a uma decisão de tribunais superiores, aprovando leis em causa própria. Para o ministro, a proposta acaba, na prática, com a prestação de contas, pois não haverá consequência para as desaprovadas.
— É o faz de conta. A Constituição Federal tem o princípio da razoabilidade. Será que é razoável dar a quitação eleitoral mesmo diante da rejeição das contas? Não se avança culturalmente cassando uma decisão de um tribunal superior mediante lei, principalmente quando se decide em causa própria. Essa aprovação não deixa bem na fotografia os congressistas — afirmou Marco Aurélio.
Em nota, o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) repudiou a aprovação de afogadilho, sem qualquer debate popular, de uma mudança na lei eleitoral. O movimento espera que o Senado rejeite o projeto e conclamou a sociedade a se manifestar contra o ato. “Sem qualquer debate popular (a Câmara) aprovou lei que anistia os políticos que fraudaram suas prestações de contas de campanha”, diz um trecho da nota. “O Projeto de Lei nº 3839/2012 atenta contra tudo o que deseja a sociedade brasileira, que se encontra mobilizada em favor dos valores da ética e da moral, que devem presidir as declarações do Parlamento.”
Políticos e especialistas eleitorais argumentam que nem sempre a rejeição de contas eleitorais é sinal de contas-sujas. Segundo eles, na maioria das vezes são problemas contábeis, erros formais, provocados pela burocracia para prestar a informação à Justiça eleitoral. Quando há uma irregularidade grave na campanha, os adversários ou mesmo o Ministério Público podem tentar cassar o registro e o mandato do candidato, com base em outro artigo da lei.
— Nem sempre a rejeição da conta é sinal da chamada contas-sujas. A prestação é mais do ponto de vista contábil e as exigências são, de tal forma, intricadas, que o candidato quase que precisa parar a campanha para prestar as contas de forma adequada — afirmou o advogado eleitoral e ex-ministro do TSE, José Eduardo Alckmin.
No Congresso, o líder do PSD na Câmara, Guilherme Campos, justifica que a votação ocorreu porque o TSE estava demorando a definir algo que afeta a vida de todos os partidos:
— O TSE alterou a regra com o jogo jogado. O que fizemos foi manter o mesmo critério.
Debate agora será no Senado
Líder do PSOL — único partido que encaminhou voto contra a aprovação do projeto na noite de terça-feira —, o deputado Chico Alencar (RJ) diz que, a pretexto de defender quem teve contas rejeitadas por pequenos erros contábeis, se manteve um absurdo maior: uma lei na qual não há qualquer sentido em prestar contas eleitorais, já que a rejeição não traz ônus.
— Essa lei acaba com o instituto da prestação de contas. Prestar contas por que motivo, se não é preciso aprová-las para ter a quitação eleitoral? A lei é um facilitário para toda e qualquer candidatura, de bagrinhos a tubarões, ninguém precisará se preocupar em prestar contas corretamente — disse Chico Alencar.
O deputado Pauderney Avelino (DEM-AM), que também votou contra, disse que o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), desconsiderou projeto seu que reforçava a necessidade de aprovação das contas para concorrer, que já tramitava desde março e, sem qualquer debate, votou o projeto oposto, de interesses dos partidos, apresentado em maio. Foram 13 dias entre a apresentação da proposta e a aprovação do projeto em plenário.
— Simplesmente ignoraram meu projeto, que foi apresentado antes. Eles tinham que, antes de aprovar o do Balestra, ter derrotado o meu — criticou Pauderney.
No Senado, o líder do governo, Eduardo Braga (PMDB-AM), acredita que o debate lá será maior. Braga afirmou que este não é um tema do governo, mas que, como senador, é contra a norma que obriga a aprovação das contas para que o candidato tenha a chamada quitação eleitoral:
— Mudar a regra do jogo para trás é algo que prejudica muitas pessoas, que não prestaram as informações não por dolo, mas por desinformação.
Há dois meses, logo após a resolução do TSE de não conceder registro eleitoral para os políticos que tiveram contas eleitorais rejeitadas, parlamentares da oposição e governistas se uniram para pedir que o tribunal revogasse a decisão. Da reunião participaram dirigentes e representantes de 18 legendas.
O Globo
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