João Pessoa, 09 de dezembro de 2022 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Por vezes, o sono me faz um daqueles convites irrecusáveis, que motivam a remarcação de uma agenda inteira para aceitá-lo, mas não consigo. Dentro da noite e no acaso de seu esplendor, o abajur do meu quarto alumiando a leitura é um feixe mínimo e ao mesmo tempo imenso. Proporciona uma conversa de vaga-lume, como diria Didi-Huberman, já que ilumina a noite sem eliminar suas sombras.
Foi madrugada adentro, à espera do programa do Jô, que li pela primeira vez sobre a dificuldade para dormir de Proust. Enquanto dedico as vinte linhas desta coluna para falar sobre o sono que nem sempre vem, Marcel Proust (foto) discorre sobre o mesmo tema em quase trinta páginas da coleção Em Busca do Tempo Perdido. Atormentavam o jovem Marcel tanto as memórias vividas quanto a ansiedade do porvir.
Acredito que em algumas dessas noites de angústia, sem conseguir pregar os olhos, Proust tenha saído de seu quarto, tomado um chá e se servido de uma madeleine. Na minha casa, sem biscoitos franceses, restam-me a calada noite preta e alguma dose de sentimento, matéria suficiente para um brasileiro compreender o cosmos. Olavo Bilac, dotado apenas disso, dizia ouvir estrelas. Aos que duvidassem de sua conversa estelar, enquanto a via láctea cintilava, o poeta recomendava amar mais. Pois só quem ama pode ter ouvido, só quem ama é capaz de ouvir e de entender estrelas.
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OPINIÃO - 22/11/2024