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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

O texto do desapego

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publicado em 17/12/2022 às 07h00
atualizado em 17/12/2022 às 05h54

(para heidelice cabral) 

EU queria escrever um texto em que não metaforizasse o desapego a partir de imagens de uma ventania, sem confundir sensações ou sensação nenhuma.

Desapegar com os efeitos de um furacão. Queria ler meu texto em voz alta nas calçadas, nos salões, nos botecos, para que todos que se sentissem representados e que, ao final, déssemos uma desapegada geral.

Das frases e das consequências da ventania que viessem separadas por espaços solares, de duas ou 1800 colinas, que deveriam ter sido escritas lá trás, apegadas e esquecidas.

Desapegar do tempo perdido, durante o tempo já vivido e o que virá.
Queria comentar, chegar a uma conclusão, mas não sei por onde começar.

Desapegar igual Milton Nascimento, que fez a última turnê e hoje ouço “O Cio da Terra”, tantos anos depois: “Debulhar o trigo, recolher cada bago do trigo, forjar no trigo o milagre do pão, e se fartar de pão”

Desapegar dos livros, das roupas, dos perfumes, do lençol que me cobre, nunca do sono e do sonho, desapegar pra valer, desapegar do perdão, com toda licença para depois do amém.

Desapegar do celular que me avisa que não tenho nenhum lembrete futuro, mas me acorda às 4 e meia para caminhar. Eu queria que o futuro me mandasse lembretes sobre como ele terá sido passado, que o futuro sentisse saudades de não ter acontecido ainda.

Desapegar das contrariedades, desapegar do presente, dos presentes, da ingenuidade, nunca do delírio, sequer das gargalhadas.

Desapegar com o que está por vir, sem ansiedade.

Desapegar do volante, dos discos, nunca da música.

Desapegar dos resultados, nunca do conteúdo, desapagar das cidades, nunca das árvores, do Instragam, do zap e ficar sossegado.

Desapegar do que atravessa a consciência, do anjo torto e do torto arado.

Desapegar das dores dos outros, de amar demais, de algo tacanho.

Meu consolo seria desapegar de tudo, do medo, do ledo engano

EU queria escrever o texto do desapego, algo que me lembrasse a canção Alvorada de Cartola, desapegar das declarações ridículas de amor que ainda faço.

Desapegar, desafogar, deixar pra lá.. Sí o No?

Kapetadas

1 –  O conservadorismo estraga quase tudo no mundo, exceto conservas e compotas.

2 – Precoce é uma criança com pressa de ser chato.

3 – Som na caixa: “O que eu quero? Sossego, eu quero sossego”, Tim Maia.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB