João Pessoa, 21 de dezembro de 2022 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Faz tempo. Ando colecionando contos.
É, sobretudo, o espírito lúdico que me move nessa curiosa tarefa que, para alguns, pode parecer estranha. Afeito ao cultivo do gênero épico e sempre enredado na leitura de um grande romance, Guerra e paz, O homem sem qualidades ou o Auto-de-fé, por exemplo, não deixo o conto de lado.
Sempre estou em volta de uma história curta, mergulhado em sua tensão, intensidade e significação, para lembrar as três categorias estéticas de um de seus mestres inimitáveis: Edgar Allan Poe, (foto) desenvolvidas por Júlio Cortázar.
É, não dá para viver sem o calor e o impacto desses enredos mágicos e de algumas personagens inesquecíveis, ao mesmo tempo em que se degusta o sabor insólito das palavras no movimento das ações e na plasticidade das imagens líricas.
O conto é como um texto poético: fechado, circular e perfeito na sua compreensão emotiva e no seu enigmático equilíbrio de polaridades existenciais. Nada no conto se perde, e tudo que é excessivo não serve à luz do rigor que o habita por dentro, em suas criptas e cúpulas bem delimitadas.
Cortázar, outro mestre do gênero, o quer mais próximo da fotografia do que do cinema; mais próximo do poema do que do romance ou da novela. Nestas aproximações, tanto pesa a noção do tempo quanto a indispensável “situação-limite”, ou o evento incomum, ou o acontecimento trágico, que lastreiam seus andaimes narrativos e a sua arquitetura iluminada.
Na minha coleção de contos não conta o critério exclusivamente artístico nem o purismo literário de índole clássica, pois sei que a perfeição não é dos humanos, e nada é mais humano que um autêntico contista. Coleciono contos baseado na fluidez e na flexibilidade do gosto, nos impulsos da sensibilidade e na convicção, certamente inexplicável, de que um conto nada mais é do que um conto. Um conto único. Aquele conto que, apesar de lido e relido, sempre me renova o prazer indescritível, silencioso e solitário, na dimensão dialógica de novas leituras.
Talvez pelo tédio ou pelo dissabor face às fraudes inventivas da literatura contemporânea, gosto, em especial, dos contos que têm começo, meio e fim, isto é, que contam, de fato, uma história. Satírica, dramática, lírica, trágica, não importa. O que importa é o impacto, é a comoção, é o enriquecimento, é a revitalização de meu olhar sobre as coisas e as criaturas ou um sentido novo, mesmo que doído e inquietante, para as experiências vividas.
Por isto mesmo, meu caro leitor, permita-me revelar algumas “pedras de toque” que integram a minha coleção em progresso. Quem sabe, você também não fará a sua. Darei apenas vinte exemplos de contos memoráveis, pelo menos para mim e de acordo com o meu critério. Dez, de gente de fora; dez, dos de casa.
“O retrato” (Gogol); “Enfermaria número 6” (Tchecov); “A morte de Ivan Ilicht” (Tolstoi); “Bola de sebo” (Maupassant); “Uma simples alma” (Flaubert); “Os mortos” (Joyce); “O perseguidor” (Cortázar); “Só vim telefonar” (García Márquez); “O outro” (Borges), e “A aventura de um leitor” (Ítalo Calvino).
“Uns braços” (Machado de Assis); “Viagem aos seios de Duília” (Aníbal Machado); “A terceira margem do rio” (Guimarães Rosa); “Amor” (Clarice Lispector); “João Urso” (Breno Accioly); “Venha ver o pôr do sol” (Lygia Fagundes Teles); “As vozes do morto” (Moreira Campos); “O cobrador” (Rubem Fonseca); “A aula” (Sérgio Sant `Anna), e “A rosa de Natália” (Aramis Ribeiro Costa).
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OPINIÃO - 22/11/2024