João Pessoa, 01 de fevereiro de 2023 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Quem gosta de ler tem certas manias. Além do ato em si da leitura, marcado pelo silêncio e pela solidão, vê-se, quase sempre, envolvido com outras expectativas que tornam a experiência mais rica e mais profunda.
Por exemplo: selecionar, em meio à multiplicidade de ofertas que a realidade nos põe à disposição, em seu suceder contínuo e variado, aqueles assuntos, fenômenos, personalidades, obras e temas com os quase nos afinamos ou pelos quais cultivamos um interesse especial, seja por critérios cognitivos, seja por razões de ordem afetiva, seja em função de diretrizes didático-pedagógicas ou pela exigência do olhar crítico e exegético.
Essa mania, ou talvez esse método, nos ensina que a leitura é uma tarefa de organização mental, uma forma sutil de ordenar e hierarquizar as coisas, as motivações, até mesmo, uma tarefa de organização física, se pensarmos na arrumação dos livros na biblioteca, nas estantes e nas prateleiras, sob o regime de vínculos bibliográficos científicos ou idiossincráticos.
Leitor de longa data e de fôlego obsessivo, venho, ao longo da vida e de minha história particular de leitura, estabelecendo algumas tipologias livrescas, tanto na esfera espacial de minha biblioteca quanto no território mais fluido de minhas preferências intelectuais. Ali, experimento o sabor do prazer de dispor os livros a partir de uma catalogação subjetiva, muito mais lúdica que operacional; aqui, vou formando como que um paideuma próprio, isto é, pequenas bibliotecas dentro da biblioteca, concernente a áreas de interesse que contemplam obras, fatos, assuntos e personalidades.
Se no primeiro caso convivo com os livros-objetos numa dimensão concreta e corporal, que vai do tocar e folhear até o contemplar e admirar a distância, em seus formatos e simetria, no segundo, mergulho por completo na experiência virtual de verticalizar conhecimentos, fruir e explorar, ao máximo, a possibilidade de me familiarizar com a temática que me prende e me estimula.
No plano físico, por exemplo, e já remetendo para o plano intelectual, tenho cuidados especiais com algumas estantes, as quais ludicamente nomeio de “Estante Pau d`Arco”, “Estante Pedra Bonita”, “Estante Onça Caetana”, “Estante Vaza-Barris”, “Estante Missa do galo”, “Estante Casa Grande & senzala”, “Estante Claro enigma”, “Estante Tabacaria” e “Estante Crime e castigo”, só para citar as mais amadas.
Como se pode observar, os autores estão por trás dos nomes, e, por trás dos nomes, estão as obras, as matérias, as ocorrências, as circunstancias e os episódios que vão cristalizando o acervo de informações e conhecimentos dos meus recortes de leitura. A princípio, rigorosamente literários, tais recortes, por força mesmo da necessidade de conviver melhor com tais autores e suas respectivas produções, vão se associando aos recortes históricos, políticos, filosóficos, sociais, éticos e econômicos, sem os quais não se compreende bem nenhum autor nem nenhuma obra.
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OPINIÃO - 22/11/2024