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Clara Velloso Borges é escritora, professora de literatura e mestranda em Estudos Literários pela Universidade Federal de Minas Gerais. E-mail: [email protected]  

Leia mulheres

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publicado em 03/02/2023 ás 07h00
atualizado em 02/02/2023 ás 20h39

Quaisquer listas literárias me causam um incômodo: a maior parte dos autores listados, seja qual for o gênero literário, costuma ser do gênero masculino. Mulheres tendem a predominar na lista quando relegadas a um gênero próprio, menor, ridículo: “literatura feminina”.

Oras, parece a versão intelectualizada de brinquedos infantis. Meninos, quando crianças, podem brincar do que quiserem: astronautas, engenheiros, pilotos. Meninas brincam de boneca e de casinha. Homens, quando metidos a escritores, escrevem sobre tudo: astronomia, engenharia, automobilismo, ficção e muita, muita autoficção. Mulheres, quando metidas a escritoras, também escrevem sobre tudo, mas tendem a ser circunscritas no perímetro de uma casinha literária.

A casa literária, que poderia ser uma mansão, dadas as dimensões de obras escritas por mulheres, nem precisa de ostentação. Precisa, na verdade, de tanto espaço que derrube os muros que a categorizam a partir do gênero da autora. Essa, sim, que necessita de um teto todo seu para poder criar.

Virginia Woolf diz que se Shakespeare tivesse uma irmã igualmente talentosa, ela teria morrido no limbo, enquanto ele ainda se tornaria o dramaturgo mais importante do mundo. A falta de espaço destinado às mulheres no mercado editorial é tão antiga que a maior parte dos textos consolidados como clássicos foi escrita por homens. A maioria dos estudos literários também é feita por e para homens. Hoje, nas universidades, a literatura escrita por mulheres até é colocada como objeto de estudo. Mesmo assim, é comum que a epistemologia utilizada para investigá-la seja de autoria… masculina. Ou seja, até podemos escrever de forma criativa, mas ainda não somos pensadoras.

Ler (mais) mulheres exige uma escolha ativa das leituras, uma busca por textos que nos interessem e sejam escritos por pessoas que nos interessem. É mais fácil se entregar aos muito mais numerosos títulos escritos por homens ofertados nas estantes. Entretanto, se quisermos um equilíbrio na representatividade, conferindo maior relevância a uma parcela central da experiência humana, precisamos dessa escolha ativa.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB