João Pessoa, 17 de fevereiro de 2023 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
O porteiro ranzinza daquele prédio comercial, as mães do mundo inteiro, as tartarugas centenárias, os baobás que saem das páginas do Pequeno Príncipe para a região de Madagascar: um dia, todos esses partirão. Cada um em seu tempo, contando com uma série de fatores, como preservação ambiental ou a prática regular de exercícios físicos. Porém, inevitavelmente, um dia, partirão.
Mesmo sendo a única garantia de uma existência, a morte é sempre desestabilizadora para quem vê o outro partir. Um dia, ainda pulsa, ainda está lá. No outro, não mais. Morrer é trabalhoso, comprar caixão é caro, reconhecer um corpo é desgastante. Como pode reconhecer meramente um corpo, e não a pessoa que até pouco tempo atrás ocupava aquele espaço?
Em Notas sobre o luto, a autora Chimamanda Ngozi Adichie (foto) escreve: “O luto não é etéreo; ele é denso, opressivo, uma coisa opaca. O peso é maior de manhã, logo depois de acordar: um coração de chumbo, uma realidade obstinada que se recusa a ir embora.” A permanência de alguém que amamos passa a ser ilegítima. Há o peso do luto em seu lugar.
Como boa parte de nós perde pessoas de significativa importância pessoal, mas não pública, não é decretado luto oficial no município, nem bandeiras são hasteadas a meio mastro. Que ultraje: o trânsito não para porque a sua vida para.
E embora o luto seja perene, como tudo que permanece vivo, se transforma. Não diminui, mas os horizontes ao redor dele se ampliam com o tempo. Paradoxalmente, a noção do encerramento fisiológico faz com que não sejamos sovinas com a vida. Enquanto for possível, o que gastarmos do seu estoque será renovado pelo próprio ato de viver.
Se toda vida tem um fim, também deveria ter um texto. Hoje, porém, fico com Fernando Pessoa, sob a rubrica de Álvaro de Campos: “Não me venham com conclusões! A única conclusão é morrer.”
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OPINIÃO - 22/11/2024