Um pacote fino, com um só livro, mais fino ainda. Quem é que rouba livros nesse mundo? Uma joia, vá lá, mas um livro?

Se faço uma compra online, conto os minutos até a entrega, monitorando cautelosamente o deslocamento da transportadora por meio de aplicativos. Parte porque não há outra pessoa para receber o pacote, uma vez que o prédio não tem porteiro, parte por causa da ansiedade pela compra que está por chegar.

Então, quando recebi uma mensagem de pedido entregue, sem ter recebido a caixa, fiquei espantada. Nenhum vizinho se manifestou, no grupo do condomínio, com cordialidade por ter pegado minha encomenda. Não havia pacotes sobre o escaninho.

Fico ainda mais intrigada. Aquela ansiedade pela encomenda é muito particular, muito minha. Quem mais ficaria animado para receber um livro de teoria literária? Não me parece um objeto desejado por furtadores, mesmo os furtadores literários. Segundo um estudo da Vintage Books & Anchor Books, Bukowski, Burroughs, Kerouac e Fitzgerald são os autores mais roubados das livrarias. Minha encomenda não é tão descolada. Por que colocariam logo essa obra on the road?

Em contato com a loja virtual pela qual adquiri o produto, me informaram que a encomenda foi assinada por um tal de S. Almeida. Olho o grupo do condomínio. Não há nenhum Almeida entre os contatos. Então, sem justificativa e sem livro, só me resta acreditar que o assinante foi Sobrenatural de Almeida, o fantasma criado por Nelson Rodrigues. Cansado de atrapalhar o Fluminense, como fazia nas crônicas do jornalista, decidiu atrapalhar também os pesquisadores.

Me resta torcer para que Gravatinha, o outro fantasma de Nelson Rodrigues, que servia como amuleto dos jogos do Fluminense, decida proteger minha biblioteca também.

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