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Kubitschek Pinheiro MaisPB
O livro “Kleiton & Kledir, a Biografia”, de autoria do jornalista Emilio Pacheco, traz a vida, a arte e a música dos irmãos Kleiton e Kledir. O selo é editora Bestiário. Kleiton e Kledir Ramil valiosos nomes à frente de dois dos projetos mais significativos, que a música popular do Rio Grande do Sul já viu: a Banda Almôndegas (década de 70) e a dupla Kleiton & Kledir, que não para.
O autor Emílio Pacheco, mergulha nos bastidores de ambos os projetos e vai mais além, abordando a trajetória de quase toda família (dos pais, irmãos de Vitor Ramil e primos do também músico, Pery Souza) Pacheco reconstrói em detalhes toda compoisição e conteúdo dos capítulos importantes da produção musical gaúcha e brasileira. Como uma boa biografia deve ser, o livro aborda aspectos pessoais dos dois personagens com a devida atenção – e responsabilidade. Nesta entrevista, Pacheco, fala sobre sua relação com a dupla e o desafio de construir essa ampla e significativa história
Há 40 anos, o mundo entrava numa das décadas mais importantes para a música. Os anos 80 foram inesquecíveis. E mexe com a imaginação até de quem nasceu depois. Isto se deve à produção cultural da época. E a música foi, sem dúvida, o grande destaque. O rock brasileiro voltou com tudo. Surgiram cantores e bandas que fazem sucesso até hoje. Os gaúchos Kleiton & Kledir saíram dos pampas, numa luz que permanece acesa.
Almôndegas de volta
Sim, a novidade quem traz é o autor da biografia, jornalista Emílio Pacheco, que anunciou o retorno da banda inicial Almôndegas, de Kleiton & Kledir, que fará dois shows neste mês de março – dia 25, no Theatro Guarany e dia 24, no espaço Araújo Vianna, em Porto Alegre. “De grande importância, prestígio e visibilidade para a música do Rio Grande do Sul, nada supera a obra da dupla Kleiton & Kledir. Mas quem os conheceu no tempo dos Almôndegas não esquece o grupo”, pontua Pacheco.
Kleiton e Kledir foram os únicos que fizeram parte de todas as formações da Banda Almondegas. A formação que estará nos shows é essa – Kleiton, Kledir, Quico Castro Neves, João Baptista, Zé Flávio e Gilnei Silveira.
Pacheco avança mais – “É como quem ouviu pela primeira vez Eric Clapton ainda no Cream, Rod Stewart no Jeff Beck Group, Peter Gabriel ou Phil Collins no Genesis, Ney Matogrosso nos Secos & Molhados, Rita Lee nos Mutantes, Lulu Santos, Lobão ou Ritchie no Vímana, Baby, Pepeu e Moraes Moreira nos Novos Baianos”
Confere a entrevista do MaisPB com o autor e fique sabendo de milhares de coisas sobre os irmãos Kleiton & Kledir.
MaisPB – Você nos contou que nunca tirou da cabeça a ideia de escrever a biografia de Kleton & Kledir. Vamos começar por esse tempo?
Emílio Pacheco – Eu sempre sonhei em escrever livros sobre assuntos de meu interesse e nunca desisti desse sonho, mas os primeiros rumos que dei à minha vida não seguiam nessa direção. Comecei a faculdade de Jornalismo aos 25 anos. Com dois trancamentos de matrícula no meio, formei-me aos 32. Comecei a escrever para o International Magazine, jornal de música editado no Rio de Janeiro e distribuído nas principais capitais do país, aos 34. Como não abri mão de meu emprego de bancário, foi só depois da aposentadoria que consegui realmente ter tempo de escrever um livro. Pelo menos do jeito que eu gostaria. Eu tinha muitos projetos na cabeça, mas três, especificamente, eram os que eu mais almejava. Dois deles, outros fizeram muito melhor do que eu faria. Lucio Haeser escreveu sobre a Rádio Continental de Porto Alegre. Saiu em 2007 o livro “Continental, a Rádio Rebelde de Roberto Marinho”. Henrique Mann organizou uma enciclopédia da música do Rio Grande do Sul, em um volume, intitulada “O Som do Sul”. Esses eram livros que eu pensava em escrever, sem saber que já tinha gente fazendo. O terceiro que eu queria fazer era justamente a biografia de Kleiton & Kledir. Então é um sonho de uma vida que estou realizando agora.
MaisPB – Você teve que ficar uma temporada fora de Porto Alegre, para buscar mais e mais informações?
Emílio Pacheco – Não foi exatamente uma temporada. Fiquei dois fins de semana na casa de um casal amigo na Praia do Laranjal, em Pelotas, examinando um enorme acervo de recortes, jornais, revistas, programas de shows, programas de festivais e releases que vinham sendo guardados por Dona Dalva, a mãe de Kleiton e Kledir, desde antes da fama dos filhos. Foram anos de pesquisa que me foram entregues de bandeja, sem os quais eu não teria conseguido escrever um livro com tantas informações em tão curto prazo. Quem separou esse material para mim foi a sobrinha de Kleiton e Kledir, Chris Ramil, a pedido dos tios. E o casal que me hospedou, Márcio Marcos Vieira Ferreira e Cristina Carriconde, me prestou toda a assessoria, buscando e levando o material na casa de Dona Dalva, sem contar café da manhã e demais refeições. Foi uma colaboração inestimável que jamais terei como retribuir.
MaisPB – Além de ser uma biografia, seu livro traz informações diversas, sobres os discos, as canções, um estudo que lembra grandes reportagens. Era assim que você imaginava seu livro?
Emílio Pacheco – Era exatamente assim. Eu comecei a preparar o livro com uma ideia muito clara de onde queria chegar. Claro que o texto final foi sendo escrito de acordo com as informações que chegavam até mim, mas eu queria fazer algo bem detalhado. Tanto que, de cara, falei que imaginava que a biografia poderia chegar a 400 páginas. Eu não teria como garantir que teria exatamente esse tamanho, mas foi a forma que achei de dizer que pretendia fazer algo de fôlego. No fim, com todos os anexos, chegamos a 394 páginas! Faltou pouco para a quantidade originalmente estimada!
MaisPB – Você se coloca no papel de fã, em alguns momentos do livro. Isso contribuiu para o impacto da obra?
Emílio Pacheco – Eu sou um ávido leitor de biografias de meus ídolos da música e acho que as melhores são as escritas por fãs. Mas não quaisquer fãs, obviamente. Fãs com conhecimento e senso crítico, que não vão ficar só elogiando incondicionalmente os ídolos. Um não-fã pode fazer um bom trabalho de pesquisa e produzir um texto bastante informativo, mas o fã já tem um conhecimento acumulado que pode ser bem aproveitado no livro. Eu geralmente noto quando uma biografia foi escrita por alguém que já conhecia o trabalho do biografado ou quando foi feita por um neófito. Eu torço pelo sucesso do livro e acho que minha abordagem de “fã pesquisador” pode ajudar bastante.
MaisPB – Escrever biografia de pessoas vivas, me parece mais complicado. Estou certo?
Emílio Pacheco –Não quando os biografados colaboram, como foi o caso aqui. Há quem tenha preconceito contra biografias autorizadas. Mas ter Kleiton & Kledir à minha disposição para responder a longos questionários que eu enviava à medida que avançava na cronologia foi maravilhoso. Confusões de memória podem acontecer, mas aí eu tinha minhas pesquisas para tirar a dúvida. Além, é claro, de minhas próprias lembranças de fã. Enfim, como eu já disse outras vezes, os depoimentos exclusivos de Kleiton & Kledir são o grande diferencial dessa biografia. Eles me ajudaram a escrever o livro.
MaisPB – Seu livro aborda tudo, cenas amorosas, os tempos de garotos e estudantes, até do romance de Kleiton com Nara Leão. Vamos conversar?
Emílio Pacheco – Pois então: as histórias desses romances foram todas fornecidas por eles. Muitas já eram conhecidas, mas eles me deram mais detalhes sobre elas. O Kleiton ainda me enviou um longo texto inédito em que ele descrevia o namoro dele com a Nara Leão. Tinha sido escrito para servir de introdução a uma biografia da cantora, mas acabou não sendo usado. Os dois namoraram bastante, mas hoje não economizam palavras para declarar o amor que sentem por suas mulheres, mães de seus filhos. O livro procura registrar tudo isso.
MaisPB – As vidas juntas, os irmãos vêm do Grupo Almondegas – vem dai sua admiração?
Emílio Pacheco –Sim, eu conto isso na introdução. Eu, como tantos gaúchos, era superfã dos Almôndegas. Lamentei muito quando o grupo acabou. Jamais poderia imaginar que, como Kleiton & Kledir, eles teriam muito mais sucesso. A dupla efetivamente colocou o sotaque gaúcho na MPB.
MaisPB – Tantos discos lançados, tem algum de sua predileção?
Emílio Pacheco – Meu disco preferido da dupla é o segundo, de 1981, aquele que tem “Deu pra ti”. Mas gostaria de mencionar outros dois que, na minha opinião, não receberam a atenção merecida: o quinto LP, de 1986, e o CD “Autorretrato”, de 2009. Como eu digo no livro, talvez não haja neles nenhuma música tão genial quanto “Vira virou” ou “Deu pra ti”, mas são álbuns perfeitos, para serem ouvidos da primeira à última faixa. O de 1986 não estourou porque o Brasil estava sob o vírus do rock nacional pós-Rock in Rio e o de 2009 saiu numa época em que só os fãs mais ardorosos ainda se interessavam por canções inéditas de seus ídolos. O desinteresse por novas músicas por parte do público é um problema enfrentado pela maioria dos artistas veteranos, o que é uma pena. Muitos deles ainda têm muita coisa boa pra mostrar, mas os fãs querem mais do mesmo.
MaisPB – Outra coisa, seu livro tem textos e fontes de diversos jornais brasileiros – foi uma grande contribuição?
Emílio Pacheco –Sim, quase tudo isso estava no acervo que examinei em Pelotas. Eu próprio já tinha feito pesquisas e fiz outras especialmente para o livro, mas o material que me foi alcançado a pedido da dupla foi o que forneceu a diversidade de fontes que enriqueceu a biografia.
MaisPB – A biografia tem centenas de fatos, até a história da repórter que perguntou aos irmãos K, se Elis Regina estaria presente no desfile da Sambodromo? É tudo verdade, né?
Emílio Pacheco Sim, é tudo verdade! Algumas histórias são tão incríveis que podem deixar o leitor em dúvida, mas pode acreditar! Acho que a mais inacreditável de todas foi o padre perguntando à noiva de Kleiton se ela aceitava “Kleiton & Kledir” em casamento! Esse fato teve testemunhas e foi registrado pela imprensa, na época.
MaisPB – Vamos lembrar dos shows que você não perdia um?
Emílio Pacheco – Eu assisti a vários shows de Kleiton & Kledir, mas o que foi mais marcante pra mim, como eu conto na introdução, foi o de 1981, em que ouvi o repertório do segundo LP pela primeira vez. A intenção deles era de que o disco já estivesse nas lojas, mas problemas com a censura atrasaram o lançamento. Então o público gaúcho conheceu canções que se eternizariam, como “Deu pra ti”, “Paixão” e “Trova”. Eu diria que ali, realmente, me tornei fã de Kleiton & Kledir como dupla. Até então eu era fã dos Almôndegas acompanhando o trabalho de dois ex-integrantes. Mas ali o novo trabalho deles me conquistou irreversivelmente. Outro show inesquecível foi o de 1985 com participação especial dos bonecos do grupo Cem Modos. Esse merecia ter saído em vídeo, mas na época quase nada se lançava de música brasileira em VHS e o DVD ainda não existia.
MaisPB – Ficou muita coisa de fora?
Emílio Pacheco – Não. Algumas informações eu gostaria de apurar melhor para uma futura edição do livro. Quem foi o empresário que propôs um show de Kleiton & Kledir no Maracanãzinho em 1995 e, mesmo sem concretizar seu projeto, acabou incentivando a dupla a voltar? Não consegui descobrir. Quando exatamente aconteceu o show da dupla em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, em que Kleiton levou um choque que poderia ter sido fatal? Quem venceu o festival do Colégio Israelita em 1970, em Porto Alegre, em que Kleiton e Kledir tiraram terceiro lugar? A pandemia atrapalhou um pouco as pesquisas, mas ainda quero descobrir tudo isso.
TURISMO - 19/12/2024