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Jornalista, cronista, diácono na Arquidiocese da Paraíba, integra o IHGP, a Academia Cabedelense de Letras e Artes Litorânea, API e União Brasileira de Escritores-Paraíba, tem vários publicados.

Pedra Bonita  busca espaço

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publicado em 26/04/2023 às 07h00
atualizado em 26/04/2023 às 04h02

 

Há 85 anos, José Lins do Rego publicou o romance Pedra Bonita. Neste livro ele afastou-se da paisagem da cana-de-açúcar para a um passeio pelo sertão de caatingas esturricadas, o mundo de coronéis, de cangaceiros, misticismo rural, padres e fanáticos religiosos. Abordou um ambiente e um tema novo na sua literatura.  

Com retardo involuntário, retornei à Pedra Bonita para uma caminhada lenta, com o coração aos pinotes quando debulhava as páginas do livro e captava as emoções que José Lins do Rego espalhou com intensidade, como se fosse a primeira leitura.  

Mesmo que o autor tenha chamado atenção para a narrativa deste romance, alertando que quase nada teria a ver com a geografia e o fato histórico ocorrido em Pernambuco no princípio do século XIX, na vila de Açu, ficou evidente que tomou como ponto de partida aqueles episódios de cunho religioso, mesmo que não tivesse a dimensão de Canudos, na Bahia, que Euclides da Cunha narrou.  

Os fatos criados pela imaginação do autor, ajudam o leitor no voo das imagens recriadas. Mesmo inventando ou modificando a realidade do momento abordado, José Lins compôs uma narrativa emocionante. Toda a história ganha novo panorama mesmo que conheçamos a realidade que povoou o Sertão daquela época cheia de mortes e crepúsculos ensanguentados. Com seu modo peculiar de contar, a prosa de José Lins agarra o leitor.  

As suas qualidades de narrador estão presentes com muita força neste romance. A pequena vila perdida na caatinga, a vida de homens humildes e de um bondoso padre, misturam-se ao fanatismo religioso, presente na repressão ao cangaço. Ele trouxe à tona as lendas do folclore, a vida nômade de cantadores de viola, a luta pela sobrevivência, a paisagem esturricada – tudo está presente nesta admirável obra, que ao seu aparecimento em 1935, Aurélio Buarque de Holanda o considerou como “romance e epopeia”.   

A releitura deste livro nos oitenta e cinco anos de sua publicação, trouxe-me prazer porque se trata de uma narrativa leve, porém com uma intensa carga emotiva.   

Quando do surgimento deste livro, aguardado com expectativa porque se anunciava que ele estava escrevendo uma história transcorrida fora do ambiente dos canaviais, surpreendeu a muitos leitores e críticos literários. Houve quem dissesse que José Lins somente trabalhava municiado de bagaço da cana, mas ele provou o contrário. Pedra Bonita constitui-se de um forte drama humano que tem uma beleza plástica imensurável, as cenas são descritas com clareza, o que faz a história ganhar emoção a cada capítulo.  

Para mim, José Lins do Rego é universal como romancista. Podemos nos orgulhar por tê-lo como conterrâneo porque o autor de Fogo Morto é um dos maiores escritores brasileiros de todos os tempos. Sua obra ainda tem muito o que ser estudada.  

 Cada página é um convite para conhecer a paisagem rústica do sertão, por isso Pedra Bonita será sempre um livro lembrado porque trouxe novos ingredientes à rica listagem de obras importantes gestadas por este paraibano que, como poucos, entendia a alma humana, e por isso terá vida longa.  

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB