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Jornalista, cronista, diácono na Arquidiocese da Paraíba, integra o IHGP, a Academia Cabedelense de Letras e Artes Litorânea, API e União Brasileira de Escritores-Paraíba, tem vários publicados.

Avelima e  Roberto Luna  

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publicado em 26/07/2023 às 07h00
atualizado em 25/07/2023 às 16h31

 

 

Carrego comigo a cidade onde nasci, junto com seus habitantes e sua paisagem, como alimento para a alma e antídoto para o banzo.  

         Posso até parecer enfadonho, repetitivo e sem assunto, mas falar do lugar onde observei o mundo pela primeira vez é um tema que nunca se esgota. Mesmo que em Serraria (foto) tenha passado momentos de tormenta, que prefiro deixá-los dormindo no recanto da memória, sempre retorno à minha terra com a mesma ânsia de outrora, de quando publiquei meu primeiro texto em 1975, justamente sobre uma visita que acabara de fazer a Tapuio, depois de cinco anos afastado do sítio onde fui criado.  

         Cachoeiro do Itapemirim continuou sendo por toda a vida a inspiração de Rubens Braga, como Itabira nunca deixou Carlos Drummond de Andrade órfão mesmo sendo um retrato na parede, como também Gonzaga Rodrigues carrega Alagoa Nova nas suas crônicas de saudade, e Hildeberto Barbosa Filho não desapega de Aroeiras, sua Comarca das Pedras.  

A poesia de Serraria chega-me com saudade e me inspira.  

         Essa saudade chegou novamente, de mansinho, quando li texto do amigo Luiz Avelima no Facebook acerca do meu conterrâneo Roberto Luna, que transcrevo agradecido. Afinal, este serrariense emprestou sua voz às noites cariocas antes de conquistar São Paulo, onde o poeta de Alagoa Nova o reencontrou no auge do sucesso.  

“Noite. Aí, a casa lotada. Estou sentado, caladinho. Ele aparece e começa a cantar. Silêncio total. Que voz! Aí, ele arregala os olhos, chega mais perto e diz:  

– Se não estou enganado, está ali um homem da cultura. Mais que isso, mais que qualquer coisa, é paraibano como eu. Que honra, Avelima!”  

Na verdade, quem se sentiu honrado foi Avelima, como ele mesmo revelou, por ter sido homenageado por um dos maiores intérpretes na história da música brasileira, independentemente de ser paraibano e, principalmente, de Serraria. Roberto Luna já nos deixou, mas havermos de louvá-lo sempre.  

Senti um orgulho danado enquanto lia o texto no Facebook e, sem demora, revelei a Avelima o meu agradecimento pelo registro de um encontro que me fez presente, naquela noite distante, como que a escutar a doce voz do conterrâneo de Serraria, primo do amigo Wellington Farias, jornalista de boa cepa.  

No mesmo instante, agarrei o lápis e o papel para rascunhar este texto, despretensioso registro de minha emoção.   

         Registrado em Cartório e Batismo na Igreja como Valdemar Farias, ele adotou o nome artístico de Roberto Luna, por inspiração do locutor Afrânio Rodrigues, em 1948. No seu currículo consta que gravou mais de 60 LPs e ganhou diversos prêmios importantes. Ele nasceu no dia 1 de dezembro de 1929, em Serraria, e faleceu no dia 26 de junho de 1922, em São Paulo, capital, onde residia há bastante tempo no Palacete dos Artistas, espécie de recanto que agrupa veteranos artistas que saíram de cena.    

Este intérprete da música brasileira iniciou sua trajetória artística na cidade do Rio de Janeiro, em 1945. Atuou no rádio e foi crooner de boates cariosas no final da década de 1940. No entanto, sua carreira ganhou impulso em 1952 quando gravou o bolero Por quanto tempo (Mariano Pinto e Don Al Bibi) e o samba-canção Linda (Erasmo Silva e Rui Rey). Foi o primeiro intérprete do samba-canção Molambo (Jaime Florence e Augusto Meira), gravado em 1955, que foi um estouro de sucesso. Também atuou no filme O bandido da luz vermelho, justamente cantando em boate.  

         Não é para se orgulhar de um conterrâneo como este, homem simples, que conquistou o mundo artístico em um período quando somente brilhavam quem tivesse talento de sobra?  

         A Paraíba costuma não fazer reverência aos seus ícones das artes. Um exemplo é o poeta Augusto dos Anjos, que saiu daqui escorraçado porque negaram o direito de ser professor. Serraria ainda não fez justiça a este artista que elevou o nome da cidade por onde andou. Ele nunca negou suas raízes de brejeiro identificadas na voz suavidade como o vento calmo que se esparrama pelos canaviais e balança as folhas das palmeiras de nossa terra.  

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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