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Luciano Maia não é ateu e ao Espaço K, diz não gostar de mentiras e de injustiça

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publicado em 18/09/2023 às 09h10
atualizado em 18/09/2023 às 08h06

 Kubitschek Pinheiro

 

Dono de um vasto currículo, quando pedi que ele mandasse as informações para fazermos a cabeça da entrevista, Luciano  mandou duas frases: “Luciano Mariz Maia é Subprocurador-Geral da República e Professor de Direito Constitucional e de Direitos Humanos na UFPB”

 Seja por generosidade, talento, seja por pragmatismo, na lógica e no conceito, Luciano Mariz Maia  é um cidadão que continua estudando e que há muito ocupa seu lugar no mundo, um misto de potencialidades, um ser humano completo. Quando ele surge é notável, seja numa festa cultural, num parlatório, sempre múltiplo.

 Sertanejo, foi quem entendeu, estendeu, assim como Celso Furtado, a importância do estudo e da leitura, o que foi e o que é necessário fazer no imediato e na vida, por muito que isso custe sair de casa, se destacar profissionalmente e, claro, formar sua família.

 Luciano é propagador do Direito, com a urgência que a história exige ao vocacionado mudanças, diante do fazer impedir a “catástrofe de as coisas continuarem como antes” , como lembra o filósofo alemão Walter Benjamin.

Luciano Mariz Maia, o desafio segue.

Em entrevista ao Espaço K do MaisPB a conversa flui, começa pelo sertão e se expande pelo mundo afora. Na próxima segunda o entrevistado é Ronaldinho Cunha Lima.

 

MaisPB  – Vamos começar pelo Sertão. Você nasceu em Pombal, um sertanejo cosmopolita. Eu penso que o sertão de nós, é a maior escola de nossas vidas, pelo muito que aprendemos com nossos pais e a liberdade sem ser vigiada. Isso não é um exemplo, é uma lição, né?

 

Luciano Mais – Meu pai, médico, ao formar-se, foi morar em Pombal, onde nasci. Mas de lá saí com meses. Morei os primeiros quatro anos de vida em Campina Grande, e desde 1963 moro em João Pessoa. Ser filho de pais sertanejos, com fortes laços familiares e culturais marcou toda a minha vida. A vida no sertão é mais simples e direta, as relações humanas são mais intensas, há proximidade e vizinhança entre todos. Minha infância foi colorida com férias nas fazendas de tios e tias muito queridos, e primos que carrego com o bem de irmãos.

 

MaisPB – Como se deu sua vinda para estudar na capital?

 

Luciano Mais –  Como disse, meu pai era médico, e clinicou em Pombal e Campina Grande. E, ao eleger-se deputado estadual em 1962, mudou-se com toda a família em 1963 para João Pessoa. Aqui fiz todos os meus estudos até a graduação. Formei-me em Direito pela UFPB em 1980. Conservo amigos dos bancos de alfabetização, com a professora Irmã Clara, inesquecível.

 

MaisPB  – Das vezes que lhe vejo, mesmo quando está a discursar, surgeuma timidez em Luciano Mariz Maia. Estou equivocado? Ou seria você é uma pessoa reservada?

  

Luciano Maia –  Talvez tímido não seja a melhor definição. Busco (o que não quer dizer que consiga) ser humilde e discreto, e procuro fazer com que os papéis públicos que exerço se expressem mais pelo serviço que devo ser do que pela autoridade que devo exercitar. Isso talvez possa ser interpretado como timidez. Percebo-me como naturalmente comunicativo. Mas gosto de preservar meu espaço pessoal, minha intimidade, minha privacidade.

MaisPB – Você é daqueles que ainda hoje estuda, mesmo tendo chegado onde chegou?

  

Luciano Maia  – Onde cheguei não é um destino, mas um lugar de serviço. E a cada diz há muito o que aprender. O que servir, a quem servir, como servir. Nesse sentido, é “vivendo e aprendendo”, como afirma a sabedoria popular. O estudo sistemático ajuda a manter-se atualizado sobre os avanços dos debates teóricos e científicos, enquanto as vivências ensinam a verdade e a profundidade de que todo o saber é sempre um saber provisório e falível.

 

MaisPB –  Recentemente vi que um filho seu se casou. Sempre chega a hora dos nossos filhos seguirem seus rumos, mas somos muito apegados a nossa cria, não é?

 

Luciano Maia  Sempre vi meu papel de pai como sendo o de alguém que deve estar ao lado dos filhos, no suporte e fortalecimento aos seus próprios projetos de vida, na conquista de suas autonomias, em todas as dimensões. A escolha de uma companheira para a vida, e as bênçãos de Deus e dos pais para essa escolha, é etapa natural e previsível, para a qual nos preparamos no amor em família. Não é um filho que sai. É uma nora que chega, e com ela a promessa de novos amores.

 

MaisPB – Você dá muito valor a cultura – prestigia artistas, vai a exposições, a lançamentos de livros. Vamos falar desse convívio tão fundamental?

  

Luciano Maia  O fascinante na cultura é que não nos apercebemos facilmente que somos o que somos porque coletivamente pensamos, acreditamos, fazemos, construímos, produzimos, dizemos, entendemos, interpretados, registramos, expressamos, coletivamente, em processo de sedimentação de experiências e vivências. Há fusão de muitos elementos no que chamamos de cultura no e do Nordeste, no e do Brasil, na e da América Latina, por exemplo. É a interação com a natureza, e, a partir dela, a confecção de instrumentos de trabalho, de descanso, de lazer. Ou simplesmente o modo de fazer, expressar algo. As culturas material e imaterial terminam sendo a pele de nossas almas, e os olhos de nossos corações. Gostaria de ter mais de Marília Rosado Maia e Walter Santos, quanto ao empenho e ao incentivo às artes e à cultura. Mas celebro a lindeza e a riqueza de nossos artistas e da nossa cultura.

 

MaisPB – O que Luciano não gosta no ser humano – são muitas coisas, gente que fala demais, que não deixa ninguém falar, gente que diz saber de uma coisa sem saber.…

 

Luciano Maia  Eu não gosto da violência nem do arbítrio, nem de mentira e de injustiça, nem da arrogância e da prepotência. Gosto da humanidade dos que exibem mansidão, acolhimento, compaixão, solidariedade.

 

MaisPB – Luciano seria ateu?

  

Luciano Maia Sou cristão. Sou católico. Essa crença em um Deus de Amor é a razão da minha esperança, é o alicerce de das minhas ações. Quero evoluir cada vez mais para viver plenamente o Amor que o Cristo nos mostrou ser possível.

 

MaisPB – Como você vê o Brasil divido – hoje mais do que nunca, com tantas confusões, destruições, inimizades por causa de políticas e políticos etc?

 

Luciano Maia  Bismarck, chanceler da Alemanha, dizia que “a política é a arte do possível”, e Jacques Chirac, ex-presidente da França, disse que “a política é a arte de tornar possível o necessário”. A política, portanto, é essencial à vida em sociedade. O que não significa dizer que não haja políticos que insuflem a emoção das massas para o ódio, a divisão, para o uso da violência, para agressão ao diferente. Confio que, em uma democracia, os radicalismos que conduzem aos enfrentamentos destrutivos não prevalecerão.

 

MaisPB –  Você fala e lê em inglês. Também transita pelo francês e espanhol. Isso facilita muito as coisas, né?

  

Luciano Maia  Facilita a compreensão da linguagem da razão. Mas tudo é insuficiente, se não houver a intenção firme de compreender. “Ainda que eu falasse a língua dos homens…”

 

MaisPB  – Você perdeu seu pai – quando ele tinha quase a sua idade e recentemente sua mãe. É difícil conviver com as perdas, né?

  

Luciano Maia   Teilhard de Chardin, padre e teólogo jesuíta, disse que “não somos seres humanos, tendo uma experiência espiritual, somos seres espirituais, tendo uma experiência humana”. Meu pai e minha mãe, nas suas experiências humanas, já demonstraram ter um espírito muito elevado, de compreensão, acolhimento, de horizontalidade e proximidade com os necessitados. Seus exemplos de vida são tão marcantes, que vivem em nós, e em todos os que tiveram o privilégio do convívio com eles.

 

MaisPB – O que é felicidade para Luciano Maia?

  

Luciano Maia  Realizar na vida toda a promessa da semente, ser eu mesmo, e, na pequenez do que sou, lembrar-me sempre que sou amado por Deus.

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