João Pessoa, 06 de outubro de 2023 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Os cabelos eram como esses ventos anárquicos soprando para todos os lados, deixando aquele garotinho preto de rosto redondo e olhar cândido, parecido com São Benedito, mas pequeninho, talvez quatro anos.
Conduzia-se no supermercado com peculiar atenção, olhos arregalados para a inocência do momento.
– Mamãe, nós vamos comprar tudo?
– Não, Miguel. Vamos comprar somente o necessário.
Que sorte! Eu que que já escrevera sobre o “nada” e estava com a cabeça mais vazia do que esses “pobres de direita”, descobri, em instante, o tema para a coluna da semana: o “tudo”
Santo Benedito! O que será o “tudo”? Só as crianças sabem. Para os adultos, o “tudo” não cabe dentro da cabeça por mais vazia que ela esteja.
O “tudo” é um paradoxo. Contém, a um só tempo, os extremos e o que há no meio deles, com uma diferença. É síntese: das verdades e das mentiras; das bondades e das maldades, do medo e da bravura e contém o nada também.
Sim. Se o “tudo” não incorporasse o nada, não seria o “todo”, afinal, as suas leis estão ungidas em um só laço explicativo: do gigantesco ao quântico, do ódio ao amor, do pouco e do muito, do infinito negativo ao infinito positivo, se é que nas leis da completude essas pontas da imaginação não estejam unidas como duas irmãzinhas siamesas.
Dizer que o “tudo” é paradoxal é dizer pouco. O “tudo” é o ponto cego da razão, afinal a racionalidade não tem aparato epistemológico para alcançá-lo, dado que os limites – e a razão é o limite da forma – contradizem o inalcançável.
Resta a fé, mas a fé é dessas intuições do “tudo” que explica a si mesma pela condição da insignificância humana. Pena que essa insuficiência da razão queira, muitas vezes, justificar a si mesma, impondo os seus limites às imponderabilidades da vida alheia.
O “tudo” mete medo, mas não deveria, afinal se o tudo for a lógica a que chamamos Deus, um nome lindo para encher o mundo de grandeza; se o “tudo” for o mal, ah, deixa pra lá: todos sabem que o “tudo” não existe.
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