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O que o romance “Golpe de Misericórdia”, da escritora Marguerite Yourcenar, (escrito em 1938), tem a ver com os tiros que Doca Street deu em Ângela Diniz, que virou filme de Hugo Prata, (interpretada pela atriz Ísis Valverde) no papel de Ângela? Nada, só os tipos no rosto.
Noutro filme “Tiro de Misericórdia” de Volker Schlöndorff (1976), uma aristocrata, a condessa Sophie de Reval, apaixona-se por um oficial prussiano que está em conflito quanto à sua sexualidade. Esse envolvimento empurra Sophie numa espiral de depressão psicossexual e define seu papel na luta armada. Esse, é uma adaptação do livro homônimo de Marguerite Yourcenar.
Bom, tiro ou golpe de misericórdia, livro nem filme, abrevia a destruição do rosto de uma mulher, mas nada é inevitável. O fantasma do homem que mata uma mulher por ciúmes é mais urgente desde sempre. Se a gente sair do livro de Yourcenar e entrar no filme de Hugo Prata, ficaremo cegos com os horrores finais. Isso muda tudo. Não, não muda nada. Fora da tela, os homens continuam matando suas mulheres.
Ângela tão bela, talvez o spolier esteja logo no início e não no final do filme. No romance é na introdução. A história de Ângela Diniz é cruel e também intrincada e o filme sequer chama o personagem de Doca Street, só pelo nome de Raul.
Com todos os motivos para viver, a personagem é um desafio, atrelado ao prazer da carne, que não é um prato cheio para se ganhar uma releitura, no filme de Hugo Prata. Ainda assim, a atriz Ísis Valverde já ganhou a minha estima, é uma personagem linda. É outra Ângela.
“Ângela” está em todo filme, claro, e a parte final da sua vida, é o que filme propõe ao mostrar como surgiu o relacionamento da socialite mineira Ângela (Ísis Valverde) com Raul (Gabriel Braga Nunes) até chegar ao assassinato da personagem-título. Quando uma mulher apanha várias vezes do marido e ela não o quer mais, ele mata.
Nesse recorte, não se sabe se o cineasta se perde naquilo que quer contar, na mais estranha das hipóteses, escolhe um caminho anêmico para retratar este “famoso” caso de feminicídio, ocorrido em dezembro de 1976. Os tiros não saem pela culatra.
O filme não é tão ruim, mas poderia ser um pouco melhor. Isis e Angela são belas.
Ângela Diniz é tratada como uma mulher encontrada, “um achado” e não lembra sequer o apelido de Pantera e não é dito nada sobre sua relação com a sociedade burguesa mineira, nem como ganhou o apelido de Pantera e se apropriou dele. Nada. É uma Ângela que goza, goza e goza, o que lhe faz bem.
São lindas as cenas do mar, mas o mar não é o cenário, é só o mar. A sensação que temos é que 47 depois, o crime chega a tela com as informações previamente conhecidas pelo público – vendido como uma cinebiografia de um relacionamento problemático, entre a beleza e crueldade.
Kapetadas
1 – Tô sendo atendido por uma profissional de uma espécie de uber da psicanálise. Tô chamando de I Froid
2 – Paz na terra aos homens de boa vontade. Isto é, paz para muito poucos. Do magnifico millõr fernandes.
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OPINIÃO - 22/11/2024