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FIM
O certo é ser gente inteligente e botar quente. Não tem boquinha. Ou vai, ou estanca. A atriz e escritora Fernanda Torres é do clã de Albert Camus. Ah, vocês conhecem a obra “Mal-Entendido” ou “Equivoco”, uma peça teatral escrita por Camus, em 1943? É de lascar, uma história cruel que eu não vou contar, não vou, não vou deixar de contar, não vou deixar, sequer me adaptar. Esquece.
FIM. Sim, o fim está em cada gesto, em cada gozo, em cada esquina, no olhar pidão, em todas as vidas e a coisa toda. Não adianta fugir, nascemos para isso. E o fim não tem a nada a ver com o desfecho, mas o início. Ou seja, o meio.
FIM, a série que está apenas em 6 episódios da GloboPlay, com texto de Fernanda Torres é uma transa urbana, que fala da vida gente, do fim da gente, da velha saideira, do queira ou não queira, faca na manteiga. É tão boa essa série que eu não vou esperar pelo fim. Não terá fim? Terá, sim.
Um spoiler está em toda parte – trata-se de um grupo de amigos que não acredita que a vida se limita a encontrar o amor e ser feliz para sempre. Uma história sobre a vida, vista pelos olhos de quem acaba de deixá-la. Isso diz tudo. Ou nada.
Comecemos pelo caixão de Ciro. No primeiro episódio, morre o protagonista. Sim, a morte é a coisa mais banal. Sempre foi. Bem antes de Seu Moisés abrir o Mar Vermelho. Para os que acreditam, é claro.
Quando eu era pequeno, minha mãe me levava para todos os velórios e eu ali com medo agarrado a sua saia cleptomaníaca. Lembro que embaixo dos caixões tinha gelo e carvão, para não exalar a podridão do cadáver. Minha mãe era prima da mãe de Luís Buñel, que fazia o mesmo com ele, quando garoto. Minha mãe era foda, Fernanda Torres é foda.
Então, a série FIM, não terá fim? Acho que não. Uma relação morre quando não tem mais o que conversar. O destino nos guia e nos empurra para o final.
Ah! A série mostra a vida de nove personagens, homens e mulheres, mas tem o padre, tem as crianças, a cidade, as imensas tristezas das alegrias iniciais, mas é como se o tempo fosse o herói e o vilão, o bêbado, o encosto, o cara que brocha, a mulher que trai o marido para ter um filho, o marido estéreo, tapas na cara. Sim, quase todos os personagens fumam.
A cara lisa, cara de pau, o início das rugas e a morte visivelmente súbita, as pessoas nas calçadas, nas janelas, quem é ela, quem é ela, se vemos tudo enquadrado?
É lindo quando Erasmo Carlos canta nas cenas da série – “Gente certa, é gente aberta” Ou quando Ney Matogrosso aparece cantando “Bandido, bandido corazón” numa tv analógica, lógica, tóxica, bosta.
A autora disse que o livro é o epitáfio do macho, “dessa geração que foi machista livremente. “A série, eu acho que é um olho… Carinhoso até meu, dessa época, que é a época de quem era adulto quando eu era criança. É um olhar feminino de hoje sobre esse comportamento”. Faz sentido.
A série Fim é genial, brota dos pelos brasis, a dor de um, do outro, o sufoco, o filho doido, o otário, as chagas, a canabis – sutilmente, a bebedeira, o futebol, a morte de Ciro, (Fábio Assunção, nunca o vi tão bem em cena) o amor de Rute (Marjorie Estiano) que canta Jobim, desperta a paixão, seguido do amor e da morte que andam de mãos dadas.
O certo é gente inteligente e botar pra quebrar.
Kapetadas
1 – Livros? Não julgue pela espessura: tem grossos que são ocos e fininhos que são intermináveis. O Estrangeiro ou A Peste de Camus são exemplos magrinhos.
2 – Sei lá se livro é mesmo o alimento do espírito. Se é, então tem multidões jejuando há séculos.
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TURISMO - 19/12/2024