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A literatura produzida no Rio Grande do Norte possui fortuna crítica considerável. A poesia, a ficção, o ensaio, a crônica, as memórias, o teatro e outros gêneros artísticos vêm, ao longo dos anos, constituindo aquilo que os epistemólogos chamam de objeto formal de estudo.
Volumes de referência, a exemplo dos dicionários e das antologias, assim como histórias literárias, estudos críticos e analíticos de períodos, vertentes estéticas, obra e autores, têm procurado, a partir de suas metodologias específicas, investigar as características de seu processo evolutivo dentro do quadro mais amplo da literatura brasileira.
Câmara Cascudo, Ezequiel Wanderley, Veríssimo de Melo, Rômulo C. Wanderley, Manoel Onofre Jr. Moacy Cirne, Tarcísio Gurgel, Anchieta Fernandes, Humberto Hermenegildo de Araújo, Assis Brasil, Constância Lima Duarte, Diva Cunha, Nelson Patriota, Alexandre Alves e Thiago Gonzaga, entre outros, colaboraram e colaboram com seu olhar crítico, reflexivo, e com o espírito ordenador que pressupõe a conduta intelectiva diante do fenômeno cultural.
A casa das letras: vol. I (Natal: Offset Editora, 2021), de Thiago Gonzaga, insere-se perfeitamente dentro desta tradição, numa vertente, parece, inaugurada por Veríssimo de Melo, com seu Patronos e Acadêmicos: Academia Norte-Rio-Grandense de Letras (Antologia e Biografia), de 1972.
Já na “Nota Introdutória”, o autor ressalta a importância da instituição fundada em 1936 por Câmara Cascudo, Henrique Castriciano, Aderbal de França e Palmyra Wanderley, entre outros intelectuais, considerando o peso de sua tradição cultural que, segundo seu entendimento, deve ser preservada e valorizada.
“Este trabalho”, assinala, “reúne artigos, publicados em jornais, sobre alguns membros da ANRL, que são literatos. Acreditamos que, dando uma pequena prova, um panorama literário atual da Instituição, permitindo, assim, uma amostragem que aceitará a tentativa de montagem de um painel crítico dos valores da casa.” Sem dúvida.
Trazendo à tona marcas e incidências estilísticas e temáticas dos escritores abordados, aspectos biobibliográficos e contextualização histórica, esforços como este contribui para o enriquecimento das fontes literárias da região potiguar, ao mesmo tempo em que tende a ampliar a visibilidade dos autores e das obras, sobretudo no sentido de facilitar o contato de suas respectivas mensagens com as novas gerações.
Vicente Serejo, Humberto Hermenegildo de Araújo, Jarbas Martins, Diógenes da Cunha Lima, Daladier Pessoa Cunha Lima, Nelson Patriota, Manoel Onofre Jr., Clauder Arcanjo, Lívio Oliveira, Dácio Galvão, Ivan Lira de Carvalho, Marcelo Alves Dias de Souza e Diva Cunha são os acadêmicos selecionados para este primeiro volume de A casa das Letras.
A crônica, a poesia, a crítica literária, a vanguarda e o direito são desafios que o ensaísta enfrenta no recorte exegético que dedica a cada um dos escritores e dos poetas focalizados, sinalizando, talvez, para o fato de que instituições de perfil conservador, como as academias de letras, não são necessariamente uniformes nem homogêneas, consideradas sobretudo as práticas individuais no manejo da palavra.
A bem da verdade, e para contradizer o senso comum, as academias são entidades contraditórias e rasuradas, entidades complexas que aglutinam diferenças individuais, de ordem ideológica, estética, política e econômica. E aqui, parece, reside o melhor de seu conteúdo e de seu sentido.
Enfim, o que importa em trabalhos desta natureza, para aquém ou além do viés crítico utilizado, é, por um lado, seu objetivo documental, e, por outro, suas implicações organizacionais.
Se existem os que escrevem no âmbito da criatividade estética, a exemplo dos poetas e dos ficcionistas; se existem os que escrevem para pensar original e livremente, como os ensaístas; se existem os que sabem fazer da prosa poesia, tal os cronistas, existem também os que escrevem para organizar essa produção, dar-lhe certa ordem, captar, na sua dispersão natural, aquilo que é essencial e duradouro.
Isto, o escritor e pesquisador Thiago Gonzaga vem fazendo como poucos, sem perder o foco da tradição a que pertence, cuja referência principal começa com Câmara Cascudo e sua obra de crítica literária, Alma patrícia, de 1921.
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TURISMO - 19/12/2024