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Procuradores de Justiça da Paraíba defenderam, em sessão nessa terça-feira (23), a atuação do Ministério Público para investigar eventuais irregularidades na construção de prédios acima da altura permitida pela Lei do Gabarito, presente na Constituição do Estado.
A investigação, defende o Colégio de Procuradores, deve se estender, além de João Pessoa, às praias de Cabedelo, Lucena, Conde, Baía da Traição e Mataraca. Na capital, uma ação quer barrar quatro prédios construídos de forma irregular e pede demolição da parte excedente.
“O que precisa ser dito é uma realidade. O problema não reside só em João Pessoa ou Cabedelo. Temos que atacar tudo. Temos Lucena, Mataraca, Baía da Traição, que já tem casa dentro do mar, Jacumã e outras praias habitadas. Eu concordo que o problema tem que ser levado ao comando do Ministério Público, para que o Ministério Público adote providências no todo, não apenas em João Pessoa”, sugeriu o procurador Francisco Sagres.
Além dos imóveis, os procuradores querem um engajamento para coibir comércios instalados de forma ilegal, como barracas. Para o colegiado, não é admissível que propriedades privadas interfiram na área voltada pública.
“O mar tem crescido e avançado. Ele não aceita desrespeito. O mar é soberano. Eu vejo que a coisa é complicada e devemos nós traçar metas com reuniões específicas. Trazendo os autores das ações, como a promotora Cláudia Cabral [que conduz o inquérito sobre João Pessoa], para que a gente possa fazer uma discussão ampla sobre o tema”, frisou o procurador Francisco Sagres.
A sugestão inicial da procuradora Cláudia Cabral, que lidera as investigações sobre as construções irregulares na orla de João Pessoa, é a demolição excedente nos prédios Hotel Bossa Design, em Manaíra, e Setai Edition e Jady Miranda, em Cabo Branco. Na visão de Francisco Sagres, que já atuou na Promotoria do Meio Ambiente, é preciso um entendimento fixo dos Poderes para evitar que o Ministério Público fique “desmoralizado”.
“Vamos derrubar os prédios existentes? Temos um prédio no Altiplano com decisão do Supremo Tribunal Feral para demolir. Isso faz 15 anos e o prédio está lá, sem habite-se, sem nada. Então é complicado ter uma decisão dessa. É cumprível? Vamos ver se cumpre. Eu tenho medo de ficarmos desmoralizados com a decisão. Eu acho que temos que sentar para definir como vamos agir”, concluiu o procurador.
O procurador Álvaro Pinto Gadelha também saiu em defesa do cumprimento da Lei do Gabarito. Ele ainda lembrou de uma ação antiga que trata sobre a “invasão” na faixa litorânea de casas antes da Constituição, mas surpreendeu ao defender o alargamento da orla, tese questionada por autoridades ambientais e pesquisadores.
“Existe uma ação tramitando diante do Ministério Público Federal que trata de invasões antes da Constituição. Edificações que foram feitas há 50 anos. Em que ninguém acha que está errado. Nesse próprio processo tem o Farol da Pedra Seca [em Cabedelo], que comprova que não foi a construção irregular. Foi o momento, que há quem diga que foi o dique de Cabedelo. É como se estudar a falésia do Cabo Branco. Qual a solução? Não sei, tem que se estudar. Agora o que eu sei é que a praia do Futuro em Fortaleza, fizeram a engorda. O prefeito aqui quis fazer, ai vem logo uma repercussão de que não pode. Eu não entendo por que não pode”, questionou.
“Se é para engordar a praia, para proteger a falésia, eu acho que merece é aplauso. Proteção que isso aconteça”
O procurador-geral de Justiça, Antônio Hortêncio, parabenizou o trabalho conduzido pela promotora Cláudia Cabral. Ele reconheceu que esse não é “um assunto fácil”, mas reconheceu que vem sendo conduzido de forma eficaz.
“Não é algo fácil. Mas, ela [Cláudia Cabral] tem avançado com a capacidade. Tenho certeza que o assunto será bem conduzido para se chegar a melhor solução”.
A investigação sobre os casos de irregularidades em prédios de João Pessoa foi divulgada, há duas semanas, pela promotora Cláudia Cabral, do Ministério Público da Paraíba.
Ela se reuniu com órgãos da Prefeitura de João Pessoa e representantes das construtoras para dialogar sobre o tema. Após o encontro, Cláudia defendeu a demolição das áreas excedentes e a suspensão do “Habite-se” (alvarás de licença para habitação).
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“O Ministério Público busca garantir para as gerações presente e futura a visão da orla, evitando a modificação da paisagem costeira, o comprometimento da ventilação e iluminação, o sombreamento da orla, aumento da pressão sobre os recursos naturais, reprodução da fauna e flora , dentre outros danos ambientais de natureza grave e irreparáveis”, ressaltou a promotora.
Construtoras, Prefeitura de João Pessoa e o Ministério Público da Paraíba aguardam a conclusão de um laudo técnico sobre a construção de prédios irregulares na orla de João Pessoa. A previsão é que o documento será entregue na próxima semana ou até o final do mês, segundo fontes ouvidas pelo Blog Wallison Bezerra.
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Com a conclusão da vistoria, o Ministério Público terá a oportunidade de avançar com o inquérito. Os três prédios investigados estão localizados nas praias de Manaíra – Bossa Design Hotel – , e Cabo Branco – Setai Edition e Jady Miranda.
O governador João Azevêdo (PSB) foi a primeira autoridade estadual a se pronunciar sobre o tema. Ele defendeu o rigor no cumprimento da Lei do Gabarito, que, segundo o Ministério Público, foi violada.
Em seguida, o prefeito de João Pessoa, Cícero Lucena, também se manifestou: “Como prefeito de João Pessoa cabe a mim cobrar o cumprimento integral da Constituição do Estado da Paraíba e o Plano Diretor do município. Isso inclui não permitir a construção de edifícios fora do gabarito”.
Nas redes sociais, Lucena garantiu que na atual gestão não houve nenhum alvará de construção para a liberação das edificações acima da altura permitida. “Se alguém descumpriu a lei, não foi a atual gestão municipal”, frisou.
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Além da defesa pela aplicação da lei, João Azevêdo condenou qualquer hipótese de compensação ao patrimônio, como tinha sido sugerido pelas empresas e avalizado pelo secretário de Planejamento de João Pessoa, José William.
O socialista ressaltou que constitucionalmente não existe uma regra colocando o pagamento de multa como compensação de construções danosas ao meio ambiente.
“Se não você não terá mais obrigação nenhuma com o plano diretor, com o código de postura. Você precisa ter um recuo frontal com cinco metros numa área, aí você constrói sua casa com quatro, na frente da casa dos outros e diz que depois paga a multa, não pode ser assim, não existe essa regra. Se tratando de lei, prefiro ficar com a lei”, arrematou.
O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil de João Pessoa (Sinduscon-JP), Wagner Breckenfeld, defendeu, em entrevista ao Portal MaisPB, a aplicação de um acordo para compensar eventuais danos ao patrimônio público.
Segundo Breckenfeld, o Sindicato espera a aplicação de multas — de “valor razoável”— e de compensação ambiental aos danos apontados pelo Ministério Público.
“Encontrando este valor, espero que seja um valor que caiba no bolso e no orçamento da empresa, que não venha afetar as suas finanças, comprometer seu funcionamento, a gente advoga que seja uma compensação ambiental ou mesmo uma remuneração, uma multa, em real, sem problema nenhum. Agora é preciso ter bom senso”, apelou.
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O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Paraíba, Harrison Targino, condenou, em entrevista ao Programa Hora H, da Rede Mais Rádio, qualquer possibilidade de “acordo” para compensar danos causados por construtoras na edificação de prédios de luxo acima da altura permitida pela chamada “Lei contra os Espigões” nas praias de Cabo Branco e Manaíra, em João Pessoa. Harrison Targino defendeu o fim do que chamou de “ciclo de estímulo à ilegalidade” praticado por parte de empresas da construção civil.
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“Tem que se imaginar que cumprir lei é obrigação. Difícil transigir em relação à descumprimento da lei, sob pena de se tornar estímulo a outros fazerem as mesmas medidas, os mesmos desvios, as mesmas ilegalidades. Nós não vemos como fazer compensação ambiental em casos dessa natureza”, disse o presidente da OAB-PB, Harrison Targino, ao Hora H.
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Fim do “ciclo da ilegalidade”
“A permissão de compensações ambientais ela termina podendo levar a determinado cálculo matemático. A compensação, às vezes, economicamente, valeria a pena. Então ‘vamos construir irregular que a gente paga uma multa ou um valor, incorpora este valor ao custo da obra e temos uma obra diferente das outras, que afeta o meio ambiente, mas se torna diferenciada para fins comerciais”, criticou o presidente da OAB-PB.
“Isso não se pode permitir, nesse ciclo de estímulo à ilegalidade que seria admitir-se que se possa descumprir a lei e impunimente permanecer descumprindo”, completou.
Alvos de investigação no Ministério Público da Paraíba (MPPB), três dos quatro prédios irregulares em construção na orla de João Pessoa mantêm o ritmo normal de obras e vendas, como constatou a reportagem do Portal MaisPB em visita realizada na semana passada.
Conforme a Promotoria do Meio Ambiente e Patrimônio Social da capital, as construções teriam ultrapassado a altura permitida prevista na Lei do Gabarito, norma da Constituição Estadual que impõe limite de altura para edificações na beira mar pessoense.
O primeiro empreendimento visitado foi o Hotel Bossa Design, da Bossa Design Empreendimentos de Hotelaria LTDA, na avenida João Maurício, em Manaíra. Nesse caso, além de ferir a Lei dos Espigões, o prédio também é investigado por aumento e invasão do recuo.
De acordo com uma portaria do Ministério Público, o Bossa Design ultrapassou, em relação ao Plano Diretor, 4,918m à altura permitida que era de 12,90m. Já em relação ao Decreto Municipal nº 9.718/21, a vistoria técnica aponta que houve a violação de 3,306m.
Procurado, o responsável pela edificação não se encontrava. O seu contato foi repassado aos repórteres, mas as ligações não foram atendidas.
Situado no metro quadrado mais caro para construção civil em João Pessoa, o Setai Edition, da Construtora Guedes Pereira, está localizado no final da Avenida Cabo Branco e em fase de finalização.
Segundo a investigação inicial do Ministério Público, a vistoria técnica concluiu que “a edificação SETAI EDITION, ultrapassou a altura máxima de 12,90m recomendada para o seu local de instalação, conforme o Plano Diretor do município de João Pessoa/PB, em pelo menos 1,376 m, totalizando uma altura de 14,276 m ”, e apontou possíveis “indícios de desconformidade de altura máxima permitida das EDIFICAÇÕES ADJACENTES ao local vistoriado”.
A exemplo do Hotel Bossa Design, a investigação em curso não afetou o cronograma do Setai Edition. A obra segue em execução. O responsável pela obra foi procurado pela reportagem do Portal MaisPB, mas também não atendeu e nem retornou as ligações.
Apresentado ao mercado imobiliário pela Porto Bello Empreendimentos, o edifício Jady Miranda fica a poucos metros do Setai Edition, também na orla do Cabo Branco.
Uma portaria assinada pela promotora Cláudia Cabral em dezembro do ano passado, diz que um engenheiro do Ministério Público realizou uma fiscalização in loco para apurar a denúncia de irregularidades.
Após a averiguação, foi possível, segundo o laudo, constatar que “a edificação Jady Miranda, ultrapassará a altura máxima em ambas as metodologias utilizadas”. No local, um estande de venda permanece ativo, com funcionamento em mais de um expediente. Como os demais casos, a construtora não quis falar com reportagem do Portal MaisPB.
Procurado, o Sindicato da Indústria da Construção Civil de João Pessoa (Sinduscon-JP) disse que não iria mais se manifestar e repassou o assunto para os advogados das construtoras denunciadas pelo Ministério Público da Paraíba.
Confira a reportagem em vídeo:
Wallison Bezerra – MaisPB
OPINIÃO - 22/11/2024