João Pessoa, 07 de fevereiro de 2024 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Se for livro de poemas, sim, porque não existe livro de poesias. A poesia é uma experiência dos sentidos. Ainda não é linguagem, não é forma, não é representação. Só quando se converte, através da materialidade dos versos, em expressão verbal ou icônica, transmuta-se naquilo que entendemos como poema. Há, assim, sensações poéticas, vivências poéticas, inquietações poéticas que, por sua vez, se formalizam no poema, por meio das operações inventivas no corpo da linguagem.
Sim, se for de poemas, é preciso ler os livros dos clássicos, antigos e modernos. Ler uma vez, duas, três, enfim, sempre ler e reler, quer no plano geral da tessitura dos versos, quer na dimensão pontual deste ou daquele momento singular da dicção lírica.
Dos antigos, penso em Dante, na Divina comédia, sobretudo pelo andamento melódico de seus tercetos rigorosos. Poucos poetas exploram as camadas acústicas dos vocábulos como Dante; poucos possuem, na elaboração das imagens, o sentido musical das palavras e dos versos, assim como a cadência geométrica do ritmo.
Dos modernos, não devo esquecer um Baudelaire, um Pessoa, um Borges, um Jorge de Lima, principalmente o último Jorge, do Livro de sonetos e de Invenção de Orfeu. Aquele Jorge que, segundo Mário de Andrade, tinha o poder de fazer com que as imagens dançassem.
Digo que a experiência dessa poesia encarnada na argila das palavras não pode nem deve ser fugaz, aleatória ou rarefeita. A grande poesia verbal exige uma convivência mais íntima com a partitura dos poemas, em seus sinais imagéticos, ideativos e sonoros. Creio ainda que esta convivência, para além do prazer que nos mobiliza a sensibilidade, traz, consigo, as diretrizes de uma sutil pedagogia, isto é, a pedagogia do poético, com tudo aquilo que ela implica de beleza e sabedoria.
Dos clássicos também podemos passar para os contemporâneos, não que um contemporâneo não possa ser clássico. É preciso, na esfera dinâmica das leituras, não olvidar aqueles poetas que estão chegando, não importa se epigônicos, originais ou diluidores. Tanto os contumazes quanto os bissextos carecem de nosso olhar de leitor sedento de novas linguagens. Não raro, os de agora nos ajudam a mensurar melhor a densidade dos grandes mestres.
Contudo, devemos ter cuidado. O cuidado de não engolirmos gato por lebre, pois, nessa faixa de Gaza em que se transformou a experiência poética da atualidade, tudo é possível na esteira irresponsável do mais frouxo relativismo.
Se o leitor for um crítico, crítico literário, terá de assumir, devido aos percalços do próprio ofício, o risco de ser apedrejado pelos irrequietos guerreiros do Parnaso, pois a sua voz não pode calar diante dos falsos moedeiros das palavras. Se for um leitor comum, aquele leitor que lê simplesmente por prazer e fruição, pode se dar o luxo de não ir além do primeiro verso, fechar o livro de poemas e voltar ao convívio dos poetas que ama. Afinal, os bons poemas se renovam a cada leitura.
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OPINIÃO - 22/11/2024