João Pessoa, 01 de março de 2024 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
No dia primeiro de março, nasceu o poeta latino Marco Valério Marcial (foto) ou simplesmente Marcial. Nesse dia, chamado de Calendas de março (Kalendae Martiae), no calendário romano, celebrava-se a festa das Matronalia, em que as mulheres recebiam presentes, por ser um dia consagrado a Juno, a deusa-mãe, protetora das mulheres, do casamento, da família e dos partos. Os ritos a Juno Lucina – aquela que traz os filhos à luz –, iniciavam o ano religioso e também festejavam o novo Sol, que traria a primavera. Destaque-se que, embora dedicado a Juno, o nome do mês foi uma homenagem de Rômulo, criador do calendário latino (século VIII a. C.), ao deus Marte, seu pai.
Fazendo um epigrama sobre o seu aniversário, o poeta Marcial afirma ser o dia primeiro de março, mês de que ele toma o nome – Marcial (Martialis) –, o mais formoso de todas as calendas, pois até as moças lhe davam presentes.
As datas de nascimento e de morte de Marcial variam num intervalo que vai de 38 a 41 (nascimento) e 101 a 104 (morte). Considerando o epigrama abaixo, que lhe dá a idade de 57 anos, e o fato de que ele chegou em Roma no ano de 64, o poeta teria nessa ocasião 26 anos, o que dataria o seu nascimento para o ano de 38. Como o Livro X, em que este epigrama natalício se encontra, teve sua primeira edição em 95, o cálculo só confirma a data de 38 como a de seu nascimento: 38 (nascimento) + 57 (idade) = 95 (data da publicação do Livro X).
Neste Epigrama XXIV, Marcial pede às Calendas Márcias (Martiae Kalendae), para juntar aos 57 anos – já se utilizaram 50 bolos e sete caixas de incenso –, que ele ora completa, outros 18, perfazendo um total de 75, se isto for útil ou conveniente a ele, o suplicante (roganti). É preciso, contudo, que todos estes anos, que constituem as três etapas da vida (vitae tribus areis) – infância, madureza e velhice – sejam cumpridos como um ciclo de vida útil, e que ele não seja acometido pela inércia de uma longa velhice. Assim sendo, após viver uma vida longa como a de Nestor – o longevo herói grego, conselheiro dos Atridas na guerra de Troia (v. Ilíada e Odisseia) –, ele não rogará mais nem um dia, estando pronto para fazer a viagem ao infernos, que ele trata metonimicamente como “os bosques da jovem Elísia” (lucos Elysiae puellae), sendo Elísia um epíteto para designar Perséfone ou Prosérpina, a esposa de Hades ou Plutão, deus do mundo inferior.
Uma vida como a de Nestor não supõe apenas longevidade, mas sobretudo longevidade com saúde, com gozo pleno da vida e energia, como a do deus Marte, pai de Rômulo, o primeiro romano. Não se deve, no entanto, descartar a necessidade de, na velhice, pormos em prática a sabedoria acumulada durante a nossa existência. Sabedoria que supõe, sobretudo, que estamos prontos para morrer.
Fiquem com o epigrama, em tradução nossa.
Epigramma XXIV, Liber X
Natales mihi Martiae Kalendae,
lux formosior omnibus Kalendis,
qua mittunt mihi munus et puellae,
quinquagensima liba septimamque
uestris addimus hanc focis acerram.
His vos, si tamen expedit roganti,
annos addite bis precor novenos,
ut nondum nimia piger senecta,
sed vitae tribus areis peractis
lucos Elysiae petam puellae.
Post hunc Nestora nec diem rogabo.
Epigramma XXIV, Livro X
Nestas Calendas de março, dia do meu natalício,
sendo o mais formoso dia, entre todas as calendas,
em que as moças também me enviam alguns presentes,
este bolo quinquagésimo e esta sétima caixinha
de incenso oloroso, ao vosso altar juntamos.
Todavia, se é útil a quem roga, acrescentai,
a estes anos, vos suplico, duas vezes nove anos,
para que não estando inerte, por velhice desmedida,
porém já tendo cumprido por completo o trio da vida,
eu consiga atingir da menina Elísia os bosques.
Se viver este Nestor, nem um dia eu rogarei.
* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB
TURISMO - 19/12/2024